quarta-feira, 24 de fevereiro de 2016

Epa!!!

Por Luiz Fernando Verísimo

Às vezes imagino como seria ser um judeu na Alemanha dos anos 20 e 30 do século passado, pressentindo que algo que ameaçava sua paz e sua vida estava se formando mas sem saber exatamente o quê

No filme “2001 — Uma odisseia no espaço”, do Stanley Kubrick, astronautas descobrem na Lua (ou era em Marte?) um misterioso monólito, de origem desconhecida. Depois fica-se sabendo que o monólito fora posto ali como uma espécie de alarme. Quando exploradores da Terra o descobrissem, seria o sinal de que nossa civilização tinha os meios para invadir o espaço e se tornava uma ameaça para as civilizações extraterrenas que nos estudavam de longe desde que o primeiro primata acertara a primeira cacetada na cabeça de outro, e sabiam do que nós éramos capazes. A descoberta do monólito era um aviso: atenção, a barbárie vem aí, disfarçada de conquista científica.

Às vezes imagino como seria ser um judeu na Alemanha dos anos vinte e trinta do século passado, pressentindo que alguma coisa que ameaçava sua paz e sua vida estava se formando mas sem saber exatamente o quê. Este judeu hipotético teria experimentado preconceito e discriminação na sua vida, mas não mais do que era comum na história dos judeus. Podia se sentir como um cidadão alemão, seguro dos seus direitos, e nem imaginar que em breve perderia seus direitos e eventualmente sua vida só por ser judeu. Em que ponto, para ele, o inimaginável se tornaria imaginável? E a pregação nacionalista e as primeiras manifestações fascistas deixariam de ser um distúrbio passageiro na paisagem política do que era, afinal, uma sociedade em crise mas com uma forte tradição liberal, e se tornaria uma ameaça real? O ponto de reconhecimento da ameaça não era evidente como o monólito do Kubrick. Muitos não o reconheceram e morreram pela sua desatenção à barbárie que chegava.

A preocupação em reconhecer o ponto pode levar a paralelos exagerados, até beirando o ridículo. Mas não algo difuso e ominoso se aproximando nos céus do Brasil, à espera que alguém se dê conta e diga “Epa” para detê-lo? Precisamos urgentemente de um “Epa” para acabar com esse clima. Pessoas trocando insultos nas redes sociais, autoridades e ex-autoridades sendo ofendidas em lugares públicos, uma pregação francamente golpista envolvendo gente que você nunca esperaria, uma discussão aberta dentro do sistema jurídico do país sobre limites constitucionais do poder dos juízes... Epa, pessoal.

Se está faltando um monólito para nos avisar quando chegamos ao ponto de reconhecimento irreversível, proponho um: o momento da posse do Eduardo Cunha na presidência da nação, depois do afastamento da Dilma e do Temer.

Luis Fernando Verissimo é escritor

Leia mais sobre esse assunto em http://oglobo.globo.com/opiniao/epa-16763581#ixzz415jUnM1G
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sexta-feira, 19 de fevereiro de 2016

Partidos não poderão concorrer as eleições se não tiverem CNPJ

Na tarde de hoje o Tribunal Regional Eleitoral do Mato Grosso - TRE-MT divulgou um alerta às pessoas interessadas em concorrer a algum cargo eleitivo nas Eleições de 2016.

De acordo com levantamento efetuado pelo TRE-MT, 799 Diretórios Municipais ou Comissões Provisórias de partidos estão com irregularidades em seus CNPJs, ou estão com seu cadastro irregular junto a Justiça Eleitoral. Ainda de acordo com o TRE-MT, estas situações podem "acarretar problemas aos candidatos no pleito que se avizinha."

Entre os órgãos partidários municipais com problemas estão o PMDB de Campo Verde; o PT de Sorriso; o PSB de Campo Verde; o PR de Sorriso; o PROS de Cuiabá; o PEN de Cuiabá; o PROS de Várzea Grande, o PC do B de Várzea Grande; e o DEM de Dom Aquino.

Consequências para os candidatos

O partido sem CNPJ não pode receber ou movimentar recursos, o que implica também na impossibilidade de doar para a campanha eleitoral dos seus candidatos.

Caso um candidato declare à Justiça Eleitoral que tenha recebido recursos do partido político, e este estiver com o CNPJ irregular, isso pode significar que o dinheiro não transitou por conta bancária específica, o que representa recurso de origem não identificada. Esta irregularidade pode levar à cassação do diploma do candidato eleito, inviabilizando ainda futuras candidaturas com a aplicação da Lei da Ficha Limpa(LC 135/2010).

O CNPJ também é exigido nas peças publicitárias das campanhas eleitorais. Todo material de campanha precisa ter o CNPJ do responsável pela contratação, sob pena de aplicação de multa. Se a contratação for do partido (e neste ano as eleições são municipais), é necessário que este CNPJ esteja regular perante a Receita Federal.

Os partidos políticos que pretendam concorrer às eleições deste ano devem manter cadastro atualizado de dados junto ao Tribunal Regional Eleitoral, lembrando que isso inclui número de telefone, fac-símile, e-mail atualizado, por meio do qual poderá vir a receber notificações, além dos endereços da suas sedes.

O TRE-AC também imitiu um alerta similar a este em 05.02.16, lembrando que o cadastro do partido deve estar atualizado perante a Justiça Eleitoral, o que inclui número de telefone, fac-símile, e-mail atualizado, por meio do qual poderá vir a receber notificações, além dos endereços da suas sedes.

Parlamentarismo: Casuísmo: a relevância ignorada do arranjo institucional

Por: LEON VICTOR DE QUEIROZ

Fonte: http://politica.estadao.com.br/blogs/legis-ativo/parlamentarismo-ou-casuismo-a-relevancia-ignorada-do-arranjo-institucional/

18 Fevereiro 2016 | 12:23

Em 25 de agosto de 1961, o então Presidente Jânio Quadros renunciou ao cargo, acentuando a instabilidade política já instalada. Seu vice, João Goulart, encontrava-se em viagem à China. Os militares opuseram-se à posse, argumentando que Goulart era uma ameaça. Em uma semana, no dia 2 de setembro, o sistema parlamentarista foi aprovado. No dia 8 do mesmo mês Goulart foi empossado Presidente da República tendo Tancredo Neves como Primeiro Ministro, a quem foram dados os poderes de chefiar o governo. Em janeiro de 1963, em um plebiscito, a população rejeitou o parlamentarismo (primeiro round).
Durante a Assembleia Nacional Constituinte (1986-1988), também se discutiu a ideia parlamentarista. A tese do presidencialismo venceu (segundo round), mas acordou-se que um plebiscito seria realizado em 1993. Em 21 de abril daquele ano, a população novamente disse não ao parlamentarismo (terceiro round), menos de quatro meses após Itamar Franco assumir a Presidência em função doimpeachment de Fernando Collor, cujo legado na presidência é conhecido por todos nós.
Há atualmente no Senado Federal uma nova discussão sobre a mudança do sistema de governo (quarto round). A relatoria está a cargo do experiente senador José Serra. Novamente o país está em crise e setores da sociedade e do Congresso não aceitam o governo Dilma Rousseff. Essa discussão poderia ficar mais pra frente, sob pena de soar casuística, mesmo afirmando que as novas regras só valeriam a partir de 2018. Ainda assim, quando meus alunos insistem neste debate eu lhes recomendo a leitura de Patterns of Democracy, de Arend Lijphart (1999). No Brasil a obra é chamada de Modelos de Democracia – mesmo nome dado aoModels of Democracy, de David Held.
Em Patterns (padrões), Lijphart estudou dez variáveis institucionais em 36 democracias, analisando meticulosamente os seus padrões para, ao final, agrupá-las em duas grandes dimensões: o modelo majoritário de democracia e o modeloconsensual.  Para chegar a esses dois modelos, o cientista político analisou: sistemas partidários (bipartidarismo x multipartidarismo); gabinetes (unipartidários ou de coalizão); dominância da agenda legislativa (Executivo x Legislativo); sistemas eleitorais (distrital x proporcional); grupos de interesse (pluralismo x corporativismo); divisão de poder (unitário x federativo); concentração de poder no Legislativo (unicameralismo x bicameralismo); revisão judicial (forte, fraca ou inexistente) e Bancos Centrais (subservientes ou independentes).
Após analisar estas variáveis, o autor dividiu os países em duas dimensões, cada qual mais associada do que a outra a um conjunto de variáveis (como mostrado na tabela a seguir). Ao final, ele conclui que a enorme variedade de instituições formais e informais encontradas nos países estudados podem ser reduzidas a um padrão bidimensional baseado nos contrastes entre governos majoritários e governos consensuais. A tabela a seguir resume melhor a associação feita:
Tabela I – Modelos de Democracia
Tabela
Nota-se que os países parlamentaristas são majoritários, de câmara única, com fraca revisão judicial e gabinetes formados por um único partido, vitorioso no sistema eleitoral distrital (first-past-the-post), que tende ao bipartidarismo. O modelo majoritário clássico é o do Reino Unido, que Lijphart chama de Modelo de Westminster (em alusão à famosa Abadia). Este modelo majoritário é adequado a sociedades mais homogêneas (mesma etnia, mesma língua, cultura, sem divisões regionais etc.) O modelo consensual se ajusta melhor em sociedades mais heterogêneas que, com diferenças étnicas, culturais e linguísticas (sem falar no poder político local – caso dos países federalistas), necessitam de uma representação parlamentar mais diversificada. Esta representação não pode ser atingida por um sistema eleitoral distrital, é preciso um modelo proporcional que tende ao multipartidarismo. Sendo um parlamento multipartidário, e sendo uma federação, é necessária outra Casa Legislativa para agrupar forças locais, ou seja, o Senado (bicameralismo). Com duas casas legislativas e uma representação política mais fragmentada, com mais partidos políticos, a formação de maiorias minimamente governativas é mais complicada, sendo necessárias coalizões. Bruce Ackerman em The New Separation of Powers (Harvard Law Review, v. 113, n. 3, 2000, p. 633-725) já alertava que o modelo americano tendia ao impasse, por ter apenas dois partidos e duas casas legislativas equipotentes. Para que um partido governasse plenamente era necessário vencer as eleições presidenciais e ter maioria em ambas as casas. O modelo ideal considerado pelo autor é o do Japão, o que ele chamou de one-and-a-half-house solution, que consistia em um Parlamento com duas casas não equipotentes. A crítica maior de Ackerman é a de que não adianta importar instituições se não soubermos do que elas são capazes de fazer quando combinadas de maneira equivocada.
Assim, não adianta pensar apenas no parlamentarismo (que funciona melhor com instituições típicas do modelo majoritário), é preciso pensar em todas as instituições políticas que compõem e dão estabilidade aos sistemas parlamentaristas. Por exemplo: o governo brasileiro tem tido dificuldade em manter a base que lhe sustenta, mas há um governo. Já a Bélgica, que combinou parlamentarismo com um sistema eleitoral proporcional e um sistema federativo, fez com que nenhum partido seja capaz de conseguir a maioria necessária para formar um governo, e cuja escolha do gabinete se arrasta por meses. Vale ressaltar que o país é bastante heterogêneo, com dez províncias e regiões que falam holandês, francês e alemão. Com 150 assentos disponíveis na Câmara dos Deputados, a Bélgica tem 12 partidos na câmara baixa e dez na câmara alta. Uma das maiores preocupações de quem cria instituições é a de produzir um sistema capaz de produzir decisões. O caso da Espanha merece atenção semelhante a partir do instante em que quatro partidos passaram a ter peso expressivo para a formação de governo.
Logo, discutir a implementação do parlamentarismo per si passa pela discussão de qual arranjo institucional iremos adotar no sentido de produzir um sistema com eficácia decisória, afastando a alta probabilidade de impasse resultante da conjunção de parlamentarismo, hiperfragmentação partidária e personalismo eleitoral. Discutir o parlamentarismo sem levar em conta o arranjo institucional soa tão casuístico quanto o foi em 1961. Nesse caso: quem seria o presidente? E o primeiro ministro? Melhor nem pensar.

Doutor em Ciência Política pela UFPE, advogado, professor da Universidade Federal de Campina Grande-PB, pesquisador do PRAETOR/UFPE e do CEL/UFMG. Voluntário do Movimento Voto Consciente. “Esse blog é feito em parceria com o Movimento Voto Consciente. Todos os autores envolvidos são voluntários da organização e dois textos são publicados por semana. As opiniões não espelham, necessariamente, o que pensa o Movimento Voto Consciente, mas carregam, como valor essencial à democracia, a diversidade expressiva de opiniões de seus analistas - todos estudantes, mestres ou doutores em Ciência Política por renomadas universidades. As temáticas terão sempre como base algum aspecto associado ao Legislativo, e podem retratar realidades e desafios municipais, estaduais e-ou federais."

quinta-feira, 18 de fevereiro de 2016

Humanos ‘modernos’ tiveram filhos com os neandertais há 100.000 anos

DNA analisado sugere relações sexuais durante dezenas de milhares de anos


Fonte: http://brasil.elpais.com/brasil/2016/02/16/internacional/1455633230_824000.html?id_externo_rsoc=FB_CM




Há um detalhe pornográfico da pré-história que destroça o relato da Criação divina elaborado por qualquer uma das religiões: o sexo com neandertais. Nossa espécie não só fornicou repetidamente com aquela outra extinta há 40.000 anos como ambas tiveram numerosos filhos férteis, deixando um rastro de DNAneandertal que sobrevive hoje em nossas células.


E não foi um arroubo de um dia. Um novo estudo revela que há 100.000 anos os neandertais e os humanos modernos já tinham filhos em comum, uns 45.000 anos antes dos primeiros encontros documentados até agora. Não houve um Deus que criasse uma espécie humana. Quando muito, criou várias diferentes que copulavam entre si. Os autores do trabalho, encabeçados pelo biólogo espanhol Sergi Castellano, traçam um passado intrincado. Os humanos modernos, os Homo sapiens, surgiram na África há uns 200.000 anos e alguns deles saíram do continente há uns 65.000 anos, cruzando pelo caminho com os neandertais europeus e dando origem a bilhões de pessoas que hoje habitam o planeta fora da África. Isso é o que já se sabia. O novo estudo sugere que há mais de 100.000 anos outra população de Homo sapiens saiu da África e manteve relações sexuais, possivelmente no Oriente Médio ou no sul da Arábia, com grupos de neandertais que estavam deslocando-se em direção à Ásia. Aquele humanos modernos pioneiros se extinguiram, mas seu rastro aparece agora no DNA extraído dos restos de uma mulher neandertal achados em uma caverna da Sibéria, na fronteira entre a Rússia e a Mongólia.
“A mescla com os neandertais ocorreu muito antes do que acreditávamos”, afirma Castellano, pesquisador do Instituto Max Planck de Antropologia Evolutiva, em Leipzig (Alemanha). “O Homo sapiens abandonou o lar paterno antes do que pensávamos. E, à luz da introgressão [o movimento de genes de uma espécie a outra], vemos que teve uma adolescência bastante animada”, brinca, por sua vez, María Martinón-Torres, paleoantropóloga do University College de Londres, e que não está a par do novo trabalho.

“É preciso imaginar a evolução humana como um jorro de interconexões entre espécies, não como uma linha com ramificações”,  Carles Lalueza-Fox

A equipe de pesquisadores anunciou no ano passado o achado de restos de 47 humanos modernos na caverna de Fuyan, no sul da China, datados de mais de 80.000 anos. A descoberta mostrava que os Homo sapiens colonizaram a Ásia antes do que se pensava. “O DNA ratifica nossa descoberta, pois fala de um cruzamento entre sapiens e neandertais há 100.000 anos, e por isso o Homo sapiens já tinha que estar fora da África antes dos 50.000 anos defendidos pelas teorias clássicas. Estamos assistindo a uma mudança de paradigma. A Ásia deixa de desempenhar um papel secundário e ganha um protagonismo revelador nas etapas cruciais da evolução”, reflete Martinón-Torres, da equipe de pesquisa das jazidas de Atapuerca, em Burgos.
O novo estudo, publicado nesta quarta-feira na revista Nature, analisa também os genomas dos neandertais europeus, achados na caverna de Vindija (Croácia) e na jazida asturiana de El Sidrón. Os cientistas também revolveram o genoma de outro indivíduo encontrado na mesma caverna siberiana onde estava a mulher neandertal, um membro da espécie dos denisovanos, desconhecida até 2010 e separada da linhagem dos neandertais há mais de 400.000 anos. Nenhum dos três, nem os neandertais europeus nem o denisovano, apresentam DNA de humanos modernos em seu genoma, o que não significa que suas espécies jamais se tenham cruzado, segundo ressaltam os autores.
Outra análise genética, realizada em 2013, mostrou DNA denisovano em humanos modernos da Ásia e Oceania, e até 0,2% de genes denisovanos em nativos americanos. O mesmo estudo, elaborado por cientistas da Universidade da Califórnia em Berkeley (EUA), sugeria cruzamentos entre denisovanos e Homo erectus, outra espécie de hominídeo que tradicionalmente tem servido para classificar restos fósseis díspares achados na Ásia e datados entre 70.000 e 1,9 milhão de anos. “Somos uma mescla de fragmentos de todos os nossos antepassados”, declarou em uma recente entrevista Svante Pääbo, diretor do Instituto Max Planck de Antropologia Evolutiva e coautor do novo estudo.
“Esses achados confirmam uma mudança de modelo da evolução humana. Vemos uma porção de setas de hibridização [misturas entre espécies] em um momento ou outro, em um sentido ou outro. Deve ter ocorrido centenas de vezes. Temos uma visão extremamente simplista da evolução humana. É preciso imaginá-la como um jorro de interconexões entre espécies, não como uma linha com ramificações”, sentencia outro dos coautores do trabalho, Carles Lalueza-Fox, pesquisador do CSIC no Instituto de Biologia Evolutiva de Barcelona.

Mapemento das bancadas da Câmara

por Étore Medeiros, Bruno Fonseca | 18 de fevereiro de 2016

Fonte: http://apublica.org/2016/02/truco-as-bancadas-da-camara/

Maiores grupos de parlamentares da Câmara são pautados por interesses corporativos, conservadores ou por ambos; mapeamos quem defende o quê


Os deputados federais da Frente Parlamentar da Agropecuária (FPA), uma das maiores e mais organizadas bancadas da Câmara dos Deputados, reúnem-se semanalmente durante um almoço em uma mansão no Lago Sul, bairro nobre de Brasília. Divulgado com antecedência também para a imprensa, o “cardápio” – nome dado pela assessoria própria da FPA às pautas que estarão em debate – na terça-feira (16) incluiu a tributação de produtos agrícolas, a indenização de propriedades quando desapropriadas e a indicação de membros para as comissões permanentes da Câmara dos Deputados, cuja composição é renovada a cada ano. Além do colegiado de Agricultura, os ruralistas estão de olho especialmente em outros dois: o de Constituição e Justiça e de Cidadania (CCJ) e o de Meio Ambiente.

“Nós vamos tentar colocar o máximo de pessoas que tenham condições de debater a questão ambiental no Brasil, não de forma ideológica nem radical, mas de forma equilibrada. Vamos tentar, sim, ter uma grande maioria”, disse à Pública, após o almoço, o deputado federal Nilson Leitão (PSDB-MT). Vice-presidente da FPA, ele é o relator da CPI da Funai e do Incra, que pretende devassar os órgãos federais, e presidiu a comissão especial que em 2015 aprovou a PEC 215 – que inclui o Congresso Nacional no processo de demarcação de terras indígenas. “Nós vencemos na parte da comissão; agora é tentar colocar logo em plenário, ver o que a Câmara vai decidir e fazer com que o Senado também possa acelerar o processo”, diz, sobre a PEC 215, cuja aprovação em definitivo é um dos principais objetivos da frente para 2016 – por mais que ela seja taxada por muitos juristas como inconstitucional.

Além da FPA, diversas outras bancadas atuam diariamente no Congresso Nacional, reunindo deputados com ideologias, motivações ou objetivos semelhantes, ou ainda com financiadores do mesmo setor. A dinâmica de funcionamento desses conjuntos temáticos é heterogênea. Nem todos possuem estrutura ou estratégia semelhante aos ruralistas – que contam com coordenadores, agitadores e negociadores entre os seus inscritos –, e em muitos casos a formação da bancada só fica clara com o desenrolar de pautas específicas ou com a ajuda dos dados de doação de campanha.

Para mostrar quais parlamentares defendem quais interesses, a Pública levantou a composição de onze das bancadas mais atuantes. Além dos ruralistas, que contam com 207 deputados, mapeamos outras gigantes da Câmara: a evangélica (197), a empresarial (208), a das empreiteiras e construtoras (226) e a dos parentes (238), o maior agrupamento da Casa – confirmando a tendência de aumento do número de deputados com familiares políticos, como a Pública mostrou recentemente.







Adicionamos ainda as bancadas da mineração e da bola, respectivamente com 23 e 14 deputados federais. Também pequenas mas igualmente fortes, pelo teor dos conteúdos que defendem, mapeamos a composição das bancadas da bala (35), dos direitos humanos (23) e da saúde (21). Nesses casos, os critérios para defini-las foram a atuação diária de cada parlamentar em temas relacionados aos segmentos específicos. Para a das construtoras, partimos exclusivamente do financiamento de campanha, que também ajudou a elaborar o levantamento da bancada da mineração.

A empresarial e a sindical consistiram em uma atualização do material publicado pouco após cada eleição pelo Departamento Intersindical de Assessoria Parlamentar (Diap), que faz uma radiografia das bancadas no Congresso Nacional. A simples troca de alguns titulares por suplentes – 33 exerciam mandato em janeiro de 2016 –, curiosamente, implicou redução nos dois grupos. A primeira perdeu treze integrantes e a segunda encolheu oito cadeiras. Proporcionalmente, a perda foi mais sentida pela sindical, que conta agora com apenas 43 deputados, contra 208 dos empresários.


Baixe a tabela com o mapeamento das bancadas da Câmara feito pela Pública
Ruralistas de carteirinha

Para mapearmos os defensores do agronegócio, incluímos todos os parlamentares que subscreveram a criação da FPA. Embora regimentalmente haja um número mínimo de assinaturas para a criação de uma frente – tornando comum um companheirismo na linha do “assina a minha, que eu assino a sua” –, esta regra geral de cordialidade não se aplica à bancada ruralista, na análise de Antônio Augusto Queiroz, diretor do Diap. “Isso vale muito para a frente de direitos humanos, por exemplo, a questão de assinar e não efetivar o apoio. É simpático pra opinião pública, mas quando é pra valer o cara desaparece ou não vai pra linha de frente. Mas ninguém assina a bancada da agricultura se não tiver vínculo direto com o setor”, explica.

Um dos mais aguerridos defensores do agronegócio na Câmara, Leitão diz que o tamanho da bancada não atrapalha o fluxo dos trabalhos. Temas espinhosos como o impeachment da presidente Dilma Rousseff, que ele defende, costumam ter debates menos consensuais entre os integrantes da FPA, mas, em outras pautas, o convencimento dos 207 deputados – ou 40% da Câmara – que compõem a bancada é mais simples. “Nos assuntos do setor produtivo no Brasil, naquilo que a frente deve defender, como a PEC 215, nós sempre temos a maioria para poder ter a vitória necessária”, afirma.


Casarão onde a bancada ruralista se reúne semanalmente para definir prioridades e estratégias. Foto: Étore Medeiros/Agência Pública

Questionado sobre o viés radicalmente conservador dos ruralistas – e mesmo com tons de ódio, em alguns casos –, Leitão se justifica. “Nos Estados Unidos, por exemplo, não tem nenhum problema em um deputado representar o setor do aço, da agricultura, do automobilismo ou da religião. O Brasil tem esse preconceito ainda, que é cultural. Eu moro num estado [Mato Grosso] que é eminentemente agrícola, que é o maior produtor de tudo. Eu moro numa região [Centro-Oeste] que é a maior região de produção. Se eu não defender o enriquecimento e a população da minha região, eu não tenho razão de estar na Câmara federal.”
Bala e Bíblia

A bancada da bala, assim chamada pela imprensa para se referir aos parlamentares financiados por indústrias de armas e munições, teve ao longo do ano passado “acréscimos” de deputados que fizeram jus a serem incluídos pela veemência e repetição com que defendem a redução da maioridade penal, o aumento de penas e, principalmente, a revisão do Estatuto do Desarmamento – algumas vitórias parciais foram conseguidas em 2015. Conhecido por ostentar um impecável uniforme militar pelos corredores e plenários da Câmara, o PM e deputado federal Capitão Augusto fala com bom humor do epíteto recebido pelo grupo. “Acabou que esse termo, que tinha um sentido pejorativo, se popularizou e com viés até contrário, demonstrando que a bancada da bala está, sim, compromissada com a questão da segurança, com o endurecimento da legislação penal, do Estatuto da Criança e do Adolescente, e por aí vai. Hoje, já não nos incomoda mais esse termo ‘bancada da bala’, mas nós somos, na verdade, da bancada da vida. O que a gente defende é a vida, principalmente do cidadão de bem”, disse.

A relação entre a turma que em parte defende a linha do “bandido bom é bandido morto” e a Frente Parlamentar Evangélica é um bom exemplo da força da articulação de grupos conservadores. “As frentes de segurança pública e a evangélica correm juntas aqui. Nós temos os mesmos valores. A gente se ajuda realmente, não integramos [a frente evangélica, da qual Augusto também faz parte] apenas com o nome, para constar, mas para efetivamente ajudar em todos os projetos que eles estão apoiando”, reconhece o PM. Ele rechaça a ideia de os pontos que unem os dois grupos sejam de um conservadorismo extremista. “Preservamos a questão da família, da moral, da ética, da honestidade. Não tem como ser radical nesses valores – ou você tem, ou você não tem. Ou você é honesto, é um cidadão de bem, ou você não é.”


Deputado Capitão Augusto (PR-SP), à direita, das bancadas da bala e da Bíblia. Foto: Lucio Bernardo Junior/Câmara dos Deputados
Pequenos, mas aguerridos

Diametralmente oposta às bancadas da Bíblia e da bala, está a turma dos direitos humanos. Apesar do reduzido número de deputados que militam diariamente no combate da opressão às mulheres, à população LGBT, aos índios e populações tradicionais, do racismo e da violência estatal, a mobilização de setores da sociedade e da militância de causas específicas rendeu a esses deputados algumas vitórias parciais importantes ao longo dos últimos anos, mesmo com somente 23 parlamentares no seu núcleo duro. A própria PEC 215, por exemplo, obsessão ruralista desde que foi proposta, no ano 2000, somente no ano passado conseguiu avançar até estar pronta para a votação em plenário. “Você pode ter uma bancada de dez aguerridos que vale por 300 que não se mobilizam. A influência de cada grupo também está associada ao número de integrantes, naturalmente, mas principalmente ao número dos que efetivamente têm compromisso com o tema”, analisa Antônio Queiroz, diretor do Diap.

Exercendo o primeiro mandato na Câmara, o paraense Edmilson Rodrigues (Psol) travou diversos embates com a bancada ruralista na comissão especial que analisou a PEC 215. Mesmo conhecendo de perto o radicalismo de boa parte de seus integrantes, entretanto, mantém a esperança no poder do convencimento. “Por mais que haja uma ação às vezes muito truculenta por alguns representantes, particularmente do agronegócio, do latifúndio, mesmo entre eles há pessoas com capacidade de diálogo. Eu sou um otimista.” Ele conta que em determinada votação sobre direitos das crianças se surpreendeu com a atitude de um deputado que é pastor. “Ele estava ao meu lado. Pegou a Bíblia e me citou um versículo para fundamentar uma posição favorável à minha e contrária à quase totalidade da bancada evangélica, mesmo que em outras situações ele seja obediente à linha geral da bancada.”


Deputado Edmilson Rodrigues (Psol-PA), da bancada dos direitos humanos, na comissão especial da PEC 215. Foto: Gabriela Korossy/Câmara dos Deputados

Rodrigues reconhece que, muitas vezes, alguns parlamentares acabam tomando posição por motivações alheias ao debate. “Às vezes, você conversa com as pessoas, mas elas dizem ter compromisso com o partido. Mais que isso, o líder do partido é um amigo pessoal, e o deputado não quer desmoralizá-lo. Em outros casos, o partido tem cargos, ministérios, é responsável pelas políticas que o Estado desenvolve, e o deputado vota como base de apoio”, diz.
Identificação

Embora sejam uma forte maneira de influenciar os deputados, as determinações partidárias ou do bloco do governo nem sempre são seguidas, e é frequente haver a liberação da bancada – quando a liderança permite que os parlamentares votem conforme bem entenderem, mesmo contra as orientações recebidas. “É uma distorção do sistema que tem levado a vários problemas. Os partidos não têm o comando, não tem nenhum partido unificado, fechado, talvez o Psol, mas porque é muito pequeno. Os blocos de interesses aqui são mais fortes que os partidos, por isso nem sempre a orientação partidária se reflete na votação”, opina o deputado José Stédile (PSB-RS).

Dirigente do Sindicato dos Trabalhadores Metalúrgicos de Porto Alegre (RS) de 1989 a 1998, ele se surpreende ao saber que é nome frequente nos mapeamentos da chamada bancada sindical. “Ela não chega a 30 deputados, os que realmente lutam em defesa da classe trabalhadora aqui dentro. Isso é reflexo do modelo eleitoral, em que você só tem chance de ganhar se tiver recursos, se é um grande líder, de uma categoria grande, ou acontecem outros casos, por exemplo, como o meu. Os meus votos não são somente da minha categoria, mas por ter sido prefeito [duas vezes do município gaúcho de Cachoeirinha] e a minha cidade ajudou a me eleger.” Stédile diz defender os trabalhadores, aposentados, agricultores e operários, mas não se identifica com nenhuma bancada. “Elas não reconhecem perdas, e a gente sabe que um país como o nosso não tem como atender tudo, então às vezes tem que abrir mão de algumas coisas pra ganhar outras.”


Metalúrgico e ex-dirigente sindical, José Stédile (PSB-RS) diz não se identificar com bancada sindicalista. Foto: Gustavo Lima/Câmara dos Deputados

Com uma leve ironia, Antônio Queiroz questiona: “Ele acha que chegou a prefeito por quê?”. Quanto à relação entre o financiamento, as bancadas temáticas e os partidos, entretanto, a análise do diretor do Diap converge com a de Stédile. “Cada deputado tenta convencer o líder a incorporar ou assumir a plataforma da sua frente parlamentar, e, não conseguindo, pelo menos que sejam liberados pra votar em sintonia com o que a frente propõe. Enquanto as legendas não se derem ao respeito, não houver uma mudança cultural, não terão como agir de modo doutrinário, programático.”
Financiamento e ideologia

“Algumas siglas são fortemente dependentes de recursos empresariais, enquanto outras se proíbem de recebê-los, como é o caso do Psol. Teoricamente, quanto mais dependentes desse tipo de doação, maior seria a probabilidade de o parlamentar cooperar com as demandas dos grupos financiadores”, analisa Dalson Britto, professor de Ciência Política da Universidade Federal de Pernambuco (UFPE). Especialista em comportamento legislativo, ele conduziu um estudo em parceria com pesquisadores da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG) sobre a influência das doações eleitorais na elaboração da agenda legislativa. O trabalho, publicado em 2015, analisou as votações na Câmara de 1999 a 2007 em relação aos projetos de interesse da Confederação Nacional da Indústria (CNI) para confirmar que, quanto maior a proporção de recursos corporativos recebidos por um parlamentar, maior a cooperação com determinado setor.

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Novo líder do PMDB pode ajudar impeachmentInfográfico: O que está em jogo no TSEManobra tenta aprovar Código da Mineração

Alguns cruzamentos de dados indicaram que cada ponto percentual adicional do financiamento corporativo no total arrecadado pelo candidato resultou em 30,7% a mais de chance de o parlamentar votar a favor da indústria. Em outro modelo estatístico, o resultado foi de 19,8% a mais de chance de ajuda ao segmento para cada ponto percentual. O professor, entretanto, analisa os números com cautela. “Um determinado deputado votou de acordo com os interesses do grupo X porque recebeu doações de campanha, ou o grupo X financiou aquele deputado porque já dispunha de informações sobre o seu posicionamento ideológico?”, questiona.

“Metodologicamente, um dos principais desafios enfrentados pelos estudiosos da relação entre grupos de interesse e comportamento congressual é mensurar influência. Essa dificuldade é ainda maior na ausência de dados confiáveis sobre o assunto”, observa Britto. Ele ressalta que o financiamento de campanha não compra os votos dos deputados, mas garante um acesso facilitado a eles, tanto para defender projetos quanto para pedir a sua rejeição. “A interação entre agentes privados e parlamentares resulta não só na formulação de uma agenda de pautas favoráveis a determinado setor, mas também na exclusão de matérias que possam ser danosas aos seus interesses.”

A ideologia, a trajetória e a base eleitoral de cada deputado também pesam na balança na hora das votações, enquanto as alianças entre diversas legendas para garantir bases de apoio aos governos contribuem para a infidelidade às orientações das lideranças partidárias. “Em uma mesma coalizão tem-se apoiadores contumazes de pesquisas científicas com células-tronco e opositores fervorosos da união homoafetiva, por exemplo. Em termos de clivagens ideológicas, é de se esperar algum nível de consistência entre as legendas partidárias e o comportamento parlamentar, mantidos outros fatores constantes. Imagine a situação de um deputado que tem que escolher entre votar de acordo com a indicação do seu líder, agradar à sua base e ao mesmo tempo contemplar os interesses dos grupos que financiaram sua campanha. É de se esperar alguma consistência ideológica nas votações; no entanto, se for para escolher entre a fidelidade às diretrizes ideológicas do partido e a lealdade aos financiadores, eu acredito que os parlamentares escolham a fonte de recursos. Afinal, campanhas eleitorais custam caro e alguém tem que arcar com esse custo. Lembrando: ‘não existe almoço grátis’”, observa o professor da UFPE.
Água e circo

O fim do financiamento empresarial, determinado por decisão do Supremo Tribunal Federal (STF) em 2015 e já válido para as eleições municipais de 2016, leva às mais diversas análises do que pode acontecer daqui para a frente durante as eleições e nas futuras composições dos blocos temáticos na Câmara. Para Nilson Leitão, vice-presidente da bancada ruralista, amplamente financiada por empresas agropecuárias, o fim dos repasses pode resultar em uma pequena queda da representação do setor no Congresso, mas a base eleitoral não se perderá com campanhas mais baratas. “Alguns defendem porque acreditam – como eu disse, eu moro num estado que eu preciso defender a produção. Isso gera votos pra mim, além de dar o resultado pra minha sociedade.”

E se essa suposta identificação com o eleitorado não se confirmar? “Talvez seja um bom treinamento, agora em 2016 [nas eleições municipais], para saber se a ausência do financiamento empresarial – que existe nos países desenvolvidos – realmente vai fazer essa falta toda. Se fizer, automaticamente vai ter mudança na lei”, adianta-se. “Se não fizer, quem sabe todos vão aprender a fazer campanha eleitoral bem mais barata, de forma que possa ser nivelada por baixo, e não pelo absurdo que muitos gastam em campanha eleitoral”, afirma o deputado, que investiu R$ 2,4 milhões para se reeleger em 2014 – os altos gastos bancados por empresas e empresários são uma tônica entre os mais influentes nomes ruralistas.

Britto, da UFPE, cita a teoria hidráulica da regulação para comparar os recursos financeiros à água – que sempre encontrará um caminho. “A proibição do financiamento empresarial fortalece sobremaneira o papel do lobby, que ainda não foi regulamentado no Brasil. Como resultado, devemos observar vários escândalos envolvendo representantes governamentais interinstitucionais e representantes políticos nas próximas eleições.”

Para Antônio Queiroz, embora seja possível um aumento de parlamentares de partidos pequenos como o Psol– e consequentemente da bancada dos direitos humanos, por exemplo, na qual atuam hoje todos os cinco deputados federais da sigla –, esse suposto crescimento não será significativo. “O quociente eleitoral é muito elevado. Nos estados em que não existe uma liderança consolidada ou alianças com outros partidos, ainda que alcancem excelentes votações, os candidatos não atingirão o quociente e os votos serão perdidos”, acredita. Calculado a partir da divisão entre o número de votos válidos e as vagas a preencher, o quociente eleitoral significa o número mínimo de votos que um partido ou coligação precisa ter para eleger um candidato. Nas eleições de 2014 em São Paulo, por exemplo, foram necessários cerca de 300 mil votos para conquistar uma vaga na Câmara.

O diretor do Diap teme que o resultado para a democracia brasileira do fim do financiamento empresarial seja desastroso. “Você vai ter como candidatos prioritários os endinheirados, que podem bancar 100% da campanha com recursos próprios, as celebridades e os fundamentalistas, que defendem causas que têm seguidores cegos. Os partidos de esquerda poderiam tirar proveito do fim do financiamento, já que têm um ativo muito importante, a militância, mas a maioria deles está vinculada ao governo, que tem uma pauta rejeitada por muitos desses segmentos”, diz.

Embora as celebridades nem sempre exerçam protagonismo durante o mandato, são disputadas pelos partidos, já hoje, por ajudarem a eleger outros parlamentares. Foi graças aos mais de 1 milhão de votos recebidos pelo deputado Tiririca (PR-SP), por exemplo, que o Capitão Augusto – aquele da farda militar e que defende a vida, “principalmente do cidadão de bem” – conseguiu se alçar ao Congresso, apesar de ter alcançado apenas cerca de 47 mil votos.

Supremo elimina presunção de inocência e permite prisão a partir de decisão de segundo grau

Quarta-feira, 17 de fevereiro de 2016
Se a condenação for confirmada em segunda instância, é possível a execução provisória da pena. Essa foi hoje (17) a decisão do Supremo Tribunal Federal, ao discutir o HC 126.292, que trata de um caso julgado no TJ/SP, cujo réu foi condenado a começar o cumprimento de sua pena logo depois de ter seu recurso exclusivo negado.
Até a decisão da mais alta Corte brasileira, a execução da pena só poderia ser realizada após trânsito em julgado. O próprio STF decidiu nessa direção no ano de 2009, ao julgar o HC 84.078. No entanto, com a nova decisão do Supremo, milhares de condenados poderão ser presos.
Votaram a favor da tese Teori Zavascki, relator da matéria, Edson Fachin, Dias Toffoli, Fux, Carmén Lúcia, Gilmar Mendes e Luís Roberto Barroso, que disse que a decisão "reestabelece prestígio e autoridade das instâncias ordinárias". Ressaltou ainda que, para ele, "com soberania do júri, poderia haver prisão na 1ª instância".
O ministro Celso de Mello lembrou que no último levantamento feito pela Corte, 25% dos réus tinham suas condenações revertidas na corte. Para ele, com a decisão, a corte tratará como culpado esses acusados que lá são absolvidos.
Pela divergência e consequente cumprimento da pena somente com o trânsito da pena votaram os ministros Marco Aurélio, Rosa Weber e Ricardo Lewandowski. "Não vejo como ultrapassar a literalidade da Constituição" - argumentou Lewandowski ao rechaçar entendimento majoritário.

"Lamento pelo Estado Democrático de Direito"

Especialistas ouvidos pelo Justificando discordaram com veemência da decisão proferida pelo Supremo. Para o Professor Doutor de Processo Penal da Universidade do Rio Grande, Salah H. Khaled Jr., a decisão proferida hoje torna a Justiça brasileira ainda mais autoritária: 
O STF foi chamado a defender a democracia no dia de hoje. A Resposta? "Me ne frego", lema fascista que significa "não me importa". O Brasil é um país ainda mais autoritário com essa surpreendente reviravolta. Não é dizer pouco. Lamento pelo Estado Democrático de Direito. O fascismo avança a cada dia. Perdemos a noção de limite.

terça-feira, 16 de fevereiro de 2016

A dança das cadeiras no poder

De olho em outra dança

EDUARDO SEINO
16 Fevereiro 2016 | 09:39
*Em parceria com Maira Lopes, doutoranda em Ciências Sociais pela UNESP, mestre em Ciência Política pela UFSCar e ex-assessora parlamentar.
Em tempos de início de mandato de qualquer governo é comum escutarmos a expressão “dança das cadeiras”. Objetivamente, ela significa nada mais do que um rearranjo das posições que compõem o Poder Executivo. Devemos lembrar que o Executivo é um ator coletivo, ou seja, não se trata somente do(a) presidente/governador(a)/prefeito(a), envolve-se aí também os ministérios ou secretarias e os muitos cargos de menor escalão decorrentes deles.
A dança ocorre em função da escolha do time e, dentro dele, da indicação de quem joga nas posições de destaque. Este processo é sempre estratégico e visto com certa naturalidade. Contudo, pode ser tensionado à medida que existir uma percepção generalizada de que algumas peças podem parecer fora do lugar, ocupando espaços que não deveriam ocupar, mas estão lá simplesmente por “troca de favores”. Toda avaliação deste tipo está sujeita a subjetividades, umas mais, outras menos.
Outro fator que gera um desconforto aos eleitores é quando o candidato eleito deixa o Legislativo para ocupar outro cargo, por indicação do Executivo. É compreensível, embora talvez falte a clareza, que cargos no Executivo tendem a aumentar a capacidade de ação efetiva do representante em determinada área. Não à toa, costumam ser bem atrativos para as figuras políticas.
A composição do Executivo não ocorre por mera escolha das primeiras opções ótimas para estarem no cargo. Ela é guiada, principalmente, pela manutenção de uma base de governo estável no Poder Legislativo. Assim, os cargos da equipe do Executivo são divididos entre aqueles que, em princípio, se dispõem como parceiros. Essa intermediação, como sabemos, é feita por meio dos partidos políticos, ainda que no nível municipal essa lógica possa variar.
Mas queremos chamar a atenção para uma dança específica e típica da corrida eleitoral que os municípios já iniciaram. Nesse timing, pode ocorrer uma mudança de ritmo na medida em que o chefe do Executivo, na impossibilidade de reeleger-se, aloca potenciais candidatos aliados em espaços estratégicos dentro do governo.
Nesta dança é interessante notar quais são as cadeiras preferidas. A Secretaria Municipal de Governo, por exemplo, está entre as mais desejadas, uma vez que por ela passam todas as informações do município. Além de ser responsável por coordenar todos os projetos, obras e serviços do município, o(a) secretário(a) de governo acaba sendo a primeira opção de representação na ausência do chefe do Executivo. E o que isso significa? Significa ter o controle da máquina pública e ganhar visibilidade, já que sua presença é quase sempre requisitada em todas as inaugurações oficiais.
Suponhamos agora que, na projeção orçamentária do município, estão previstas a entrega, no último ano do governo, de centenas de casas populares. Neste cenário, para um possível candidato é extremamente interessante assumir a Secretaria de Habitação. Num contexto em que direitos e políticas públicas são facilmente confundidos com favores, protagonizar a entrega dessas casas pode significar uma projeção política personalizada que pode ser revertida em ganhos eleitorais.
Por contraste, o mesmo interesse não é estendido às Secretarias cujos trabalhos exigem uma complexidade técnica e não oferecem a mesma visibilidade como, por exemplo, a Secretaria da Fazenda ou de Negócios Jurídicos. As atividades atribuídas a estas secretarias dificilmente reverberam exposição pública do secretário, muito embora a qualidade de seus trabalhos seja vital ao bom funcionamento da administração pública. Por isso, é comum que elas não sejam alvos de disputas políticas tão acirradas.
Se levarmos em conta que nosso processo eleitoral é, sobretudo nos pequenos e médios municípios, marcado pelo personalismo político, nada mais interessante do que poder usar a máquina pública para construir uma memória visual que tende, em última medida, a gerar votos.
Para esta dança também cabe a atenção do eleitor na hora de escolher seu representante, já que, às vezes, o mais garboso dos cavalheiros ou a mais elegante das damas nem sempre são aqueles que melhor sabem dançar.

Mestre em Ciência Política pela USP, pesquisador do Laboratório de Política e Governo da UNESP/Araraquara e professor de Educação Política para jovens e adultos. Voluntário do Movimento Voto Consciente.