quarta-feira, 23 de janeiro de 2013

diz o jornal que morreu um coveiro


diz o jornal que morreu um coveiro
- era aquele que descansava - um pouco - sentado em algum muro
mas próximo da rua arterial do que deveria supor um engenheiro de tráfico, ou o que o valha, 
em seu gabinete
 - descansava e esperava
por aquele encomendado pela morte
com uma dose de amargo
que somente a miséria seria capaz de impingir
o que vinha no caixão
não fora forte suficiente na vida
não havia se diplomado
não havia concluído o ensino médio
escrever mal sabia
o próprio nome
não havia conseguido um emprego
não havia reunido os requisitos para a aposentadoria
na madre previdência social
não havia conseguido uns trocados [para pagar a cirurgia
que nunca teve em vida inteira em suas mãos naquela quantia anunciada
pelo doutor, este sim, diplomado em universidade pública e federal
como anunciava o quadro em seu consultório que devia ter o dobro
do tamanho
do seu barraco no morro
porque casa, não havia conseguido, nem mesmo alugar
mas a sua culpa derradeira  e capital
numa fida de fracassos desfilados
era
a de que não havia conseguido suportar
o tempo de espera
para o atendimento no sistema único de saúde:
[ 50 horas contadas em segundos de agonia e dor ]
isso dizem os jornais do dia 23 de janeiro de 2013
da cidade de joinville, estado de santa catarina
o país sendo o Brasil mesmo
o coveiro esperava sentado
pelas ministras da igreja
dizer que foi atingido
pelo veículo
governado
àquela altura
pelas representantes divinas
na terra
poderia parecer exagero
ou invencionice literária
neste caso
o melhor
é apelar aos fatos
dos quais
desde que não seja em assunto de política
ou de ilustres personagens
os jornais se encarregam
tão bem em retratar
23/01/2013 - Jaraguá do Sul

terça-feira, 22 de janeiro de 2013

O poder do dinheiro


Por Henrique Fontana*

A cada eleição disputada sob as regras atuais fica mais evidente que o nosso sistema político necessita de profundas mudanças para manter sua legitimidade. Campanhas caríssimas e crescentemente influenciadas pelo poder econômico esvaziam o jogo político do sentido mais profundo da disputa democrática: a possibilidade de que todos os atores sociais, independentemente de sua condição econômica, possam influir no debate de ideias e projetos.
As campanhas viraram uma corrida do ouro para conquistar o voto do eleitor: ideias, programas, projetos e a visão dos candidatos estão sendo substituídos pela força do dinheiro. Em geral, candidatos com grande poder econômico têm enorme vantagem nesta injusta disputa eleitoral. Assim, a democracia de iguais fica cada vez mais distante e o poder econômico cada vez mais forte para determinar o resultado do processo eleitoral.
O volume de gastos nas campanhas tem sido decisivo na eleição de um candidato, apontam dados do TSE. Dos 513 eleitos para a Câmara, 369 foram os candidatos que mais gastaram nas campanhas de 2010. Os 513 eleitos gastaram, em média, doze vezes mais do que o restante dos candidatos (em alguns estados, trinta vezes mais). Os gastos declarados em campanhas eleitorais saltaram de R$ 800 milhões para R$ 4,8 bilhões em oito anos.
Aos céticos em relação ao uso de recursos públicos para as campanhas eleitorais devemos lembrar que o sistema vigente “cobra” caro do cidadão o retorno dos recursos privados despendidos. Esta cobrança pode vir embutida nos preços dos produtos vendidos à população pelas empresas financiadoras, de forma lícita, ou incentivar relações de interdependência, e às vezes até de promiscuidade, entre parlamentares ou governos e determinados interesses privados.
Prejudica-se profundamente nossa democracia porque paira sempre a suspeita de que, cedo ou tarde, a fatura será cobrada e os interesses privados se sobreporão aos públicos. O financiamento público exclusivo é uma das armas mais poderosas para combater a corrupção.
Portanto, para democratizar, dar mais independência aos eleitos, garantir espaços a todos os que desejem se candidatar e, principalmente, ampliar o combate à corrupção, defendemos o financiamento público exclusivo de campanhas. Porque possibilita um financiamento livre de interesses outros que não sejam os legítimos interesses de representação política.
Também permite aumentar a participação política de candidatos que não possuem recursos e diminuir a influência do poder econômico no sistema político. O financiamento público está definido por critérios claros e transparentes com um teto de gastos estabelecido e fiscalizável.
Fonte: Aldeia Gaulesa

*Henrique Fontana é Deputado Federal pelo PT

"Uma floração psicodélica de riscos e rabiscos"

Despertei com o barulho do sol acordando
"Uma floração psicodélica de riscos e rabiscos"
Encontro um poema seu
Tão Dalto Trevisan
Embaixo de um guarda-chuva

Não fale amor, ouça le bruit de la mer
Rugindo dentro do meu olhar

Na janela depois do horizonte
encarava uma maneira distante
de viver sem gastar o tempo

Não fale amor, sinta o sopro
verde ou úmido do mar azul

estive navegando umas idéias
inventando umas mentiras graves
remediei venenos e serpentes
mas não restei curado
de todo

e sigo
imaginando riscos e rabiscos
tortos ou amarelos
como gritos de Van Gogh
antes e depois da última colheita

e sigo
imaginando a vida
antes e depois da última colheita
como Van Gogh

não há como saber
e me perguntastes
com demandas sérias
talvez devêssemos mesmo
ser todos virgens outra vez

ou belos e bons
selvagens
como nunca
teríamos sido

são só
uns riscos e rabiscos
florecendo amarelos de vergonha
diante da erva daninha
verde ou azulada
com tanta raiva desta teimosia
inventiva de imaginar o impossível
como Vang Gogh
pendurado em algum Hall de Wall Street




sexta-feira, 18 de janeiro de 2013

Taxar os ricos (um conto de fadas animado)



E a polícia ainda é usada para dispersar os 99%...em nome do que???? E, principalmente, de quem???

http://www.bbc.co.uk/portuguese/videos_e_fotos/2011/11/111115_occupy_wallstreet_dg.shtml



quinta-feira, 17 de janeiro de 2013

A relação entre desigualdade e criminalidade


LUIS HENRIQUE AMARAL
(Jornal "Folha de São Paulo, 03/09/95)
Raciocine: um país onde cada habitante recebe em média US$ 3.000 por ano e produz riqueza econômica próxima à do Canadá, nação de Primeiro Mundo, deve ter índice de criminalidade muito menor do que um outro, miserável, que gera 65 vezes menos riqueza e tem renda por habitante abaixo de US$ 500?
A resposta é não. O Brasil, o primeiro país do exemplo acima, tem, proporcionalmente à população, 10 vezes mais homicídios por ano do que Gana, o país pobre.
A principal causa da criminalidade não está na pobreza em si, mas na disparidade entre ricos e pobres num mesmo lugar.

É isso que explica, segundo especialistas em segurança pública de vários países, porque a sociedade brasileira tem a maior média de homicídios do mundo, entre os países que não estão em guerra ou sofrendo com guerrilhas.
O Brasil detém também o título de campeão mundial da desigualdade social, conferido pelo Banco Mundial, que divulgou estudo no mês passado informando que, aqui, os 20% mais ricos concentram 32 vezes mais renda do que os 20% mais pobres.
Cresce a desigualdade e cresce a violência. Na Grande São Paulo, por exemplo, a taxa de homicídios anual por grupo de 100 mil habitantes aumentou 83% entre 1984 e os primeiros meses de 95.
O nível de desigualdade social é uma das poucas causas da criminalidade que podem ser quantificadas. Tabela feita pela Folha, com alguns países que possuem estatísticas sobre homicídios, demonstra que, quanto maior a desigualdade social, maior a violência.
Outros fatores, como racismo, alcoolismo, drogas, facilidade de comprar armas e o baixo índice de escolaridade também pesam e agravam o problema. Mas o fato é que as cidades mais violentas do planeta têm como característica comum a desigualdade acentuada entre ricos e pobres.
Pelas estatísticas, nos países onde não há grandes diferenças sociais, mesmo que sejam muito pobres, a criminalidade é baixa. O exemplo de Gana, localizado no oeste da África é eloqüente, com 2,1 casos de homicídio para cada 100 mil habitantes. No Brasil, segundo o Ministério da Saúde, a média de casos de homicídios, por ano, por grupo de 100 mil habitantes, é 19,4. Este dado é de 1990. Hoje, estima-se em 21.


A constatação completa-se quando se observa países com melhor distribuição de riqueza, como a França, Inglaterra ou o Japão. Todos têm baixa criminalidade.
Paris, a capital da França, tem baixos índices de violência concentrada nos bairros de imigrantes pobres, principalmente argelinos_ e um nível de desigualdade muito inferior ao de São Paulo.
Segundo o estudo do Banco Mundial, os 20% mais ricos da França concentram 6,5 vezes mais renda do que os 20% mais pobres. Em Paris, o número de casos de homicídio por grupo de 100 mil habitantes em 93 foi 1,2.
No Rio de Janeiro, foi 56. Nos EUA, em 93, a média de homicídios foi de 8,4. No Japão, de 1,2.
Segundo o médico e pesquisador do Centro de Estudos de Cultura Contemporânea, Marcos Akerman, que esteve em Acra, capital de Gana, para comparar a cidade com São Paulo, "não é a pobreza absoluta que causa a violência, mas a pobreza relativa, quando um tem mais do que o outro".
É o caso do México, onde a crise econômica tem aumentado o fosso entre ricos e pobres, fazendo crescer a criminalidade.
A informação é do criminalista e professor de direito da Universidade Nacional do México, Rafael Ruiz Harrell.
"Nos dois últimos anos, temos tido uma crise severa. Em 94, cresceu 27% a delinqüência em relação a 93. Este ano, nos primeiros sete meses, a delinquência deve aumentar 50% em relação a 94, na Cidade do México", diz.
Ainda segundo Harrell, o índice de homicídios na Cidade do México começou a subir em 1980.
Em 94 foram registrados 16,4 casos por grupo de 100 mil habitantes. Em 95, esta média subiu a 17,1.
Segundo ele, no México, em 1950, os 5% mais ricos ganhavam o mesmo que os 40% mais pobres. Em 1990, os 5% passaram a ganhar o mesmo que os 62% mais pobres.
Para a professora de sociologia econômica da Faculdade de Economia e Administração da USP, Ana Maria Bianchi, "quando há riqueza e opulência convivendo com a miséria, aumenta o sentimento de privação do indivíduo, levando-o à violência".
Segundo Ana Maria, a "sociedade exige o sucesso e a ascensão de seus membros, mas não oferece oportunidades, levando as pessoas a buscarem isso de forma ilegal."
Na mesma linha, Akerman cita um estudo feito no Rio indica que a criminalidade também aumenta por ser a "única instituição" a oferecer um projeto de ascensão social para negros e mulatos.
"Quando a pessoa se pergunta qual a melhor forma de resolver o problema da falta de mobilidade social, a única resposta que encontra é a criminalidade", diz ele.
Para o psicólogo britânico especializado em violência, Oliver James, 41, a crescente desigualdade social e seu reflexo no relacionamento familiar são os principais fatores da criminalidade na Inglaterra. "Ela prejudica as relações familiares", diz.
Fonte: Blog do Nassif

quarta-feira, 16 de janeiro de 2013

qu'est-ce que


é madrugada
2 ou 3 horas
uns cães
latem na rua
caminhões passam
zunindo pneus no asfalto negro
aqui ou em qualquer lugar
quem mais
percebe estes instantes passando
as horas vazias
repletas de ruídos surdos
neste segundo
quem desejara ter morrido
quem terá nascido
qual folha há se desprendido de qual copa mais alta daquela árvore prometida
para o cimento
levo meus olhos ao solo
rastejo com meu olhar as minucias do corpo
que terá sido meu
levo meus olhos À beira
contemplo o horizonte segundo a perspectiva do horizonte
e tudo faz-se patético
que sentido há no sentido e no sentimento
vivo segundo regras herdadas não sei de quem ao certo
a fraude está em acreditar-se vivo

que é
que é
que é
qu' est-ce que 
esqueci de perguntar quando já era nascido
depois veio la muerte
entrou pelos meus ouvidos
e fez-se crer possível
que é
que é
que é
passam as rodas
passarão os rodos
pass
pass
passarão todos
passarão
que é
que é
ousaria dizer
apenas no teu ouvido frio
umas mentiras bem verdadeiras
sobre o que inventaria ali mesmo
deitado e nu com o teu cabelo sobre o meu rosto esquerdo
ousaria dizer somente pra tu
mentiras curtas certeiras
ou bem compridas como nos sonhos
segundo as circunstâncias metereológicas d'aqui de dentro
leva tempo pra inventar uma verdade bem mentirosa
no teu ouvido
frio
com que cara ficarias depois
debochando dos meus delírios dos meus inventos
com quantos dentes haverias de fazer um sorriso
mais lindo do mundo

algum dia havia de lembrar ao mundo
que aqui pisou o teu coração
dentro do teu corpo fino
algum dia havia de decretar feriado
e o minuto de silêncio
em memória sua
havia de ficar uma memória presa
em algum ramo
ou no muro de alguma escola em meio aos ferros retorcidos naquele buraco que fizemos para fugir de uma aula de geografia que nãoexistiu mas que fabriquei agora mesmo na nossa memória de meninos que queriam ter vivido num tempo que não era
ou 

como são cruéis ou estranhas
as formas que o tempo
tem
para cruzar o fio de vida
das pessoas

mas não tem importância
vou escrever um diário dos dias que queríamos
e serão nossas memórias
tão mais reais quanto mais velhos formos
e espertos para acreditar
nas nossas próprias mentiras
as que escolheremos
segundo a conveniência metereológica
cá de dentro.

sábado, 5 de janeiro de 2013

Mário Quintana – Ano novo


Mário Quintana – Ano novo


Lá bem no alto do décimo segundo andar do ano
Vive uma louca chamada Esperança
E ela pensa que quando todas buzinas
Todos os tambores
Todos os reco-recos tocarem:
- Ó delicioso vôo!
Ela será encontrada miraculosamente incólume na calçada – outra vez criança
E em torno dela indagará o povo:
- Como é o teu nome, meninazinha dos olhos verdes?
E ela lhes dirá
( É preciso dizer-lhes tudo de novo )
Ela lhes dirá bem alto, para que não se esqueçam:
- O meu nome é ES – PE – RAN – ÇA …