segunda-feira, 12 de outubro de 2020

Eleições 2020 - O que esperar da cabeça do eleitor?

 Fui provocado pelo jornalista Hassan do Jornal AN a escrever sobre o processo político eleitoral de 2020. 

Segue abaixo, em primeira mão, o extrato da entrevista enviada e que deve ir ao publico ao longo da próxima semana:

 Entrevista do Professor Dr. Jeison Giovani Heiler ao jornalista Hassan - AN

Muita coisa mudou em relação ao cenário político de 2016. Naquela eleição Temer era o presidente e o país acabara de passar por um impeachment. Bolsonaro era ainda um azarão e poucos apostavam em sua eleição. Sem dúvidas o que marcou a cabeça do eleitor naquele pleito foi um forte sentimento de rejeição ao PT e um otimismo com os rumos da operação Lava Jato. Outro fator ainda marcante era a polarização PSDB/PT como rescaldo ainda das eleições presidenciais de 2 anos antes. Observando o resultado eleitoral em 2016 o recuo de partidos tradicionais foi nítido: o PT encolheu no número de prefeituras em quase 60% caindo de um total de 630 para 256 municípios administrados (1º turno).  PMDB, PSDB, mantivera-se estáveis enquanto partidos sem expressão política deram os primeiros indícios que a cabeça do eleitor estava mudando. Partidos considerados nanicos como PHS (125%) PSL (30%) PTN (150%) tiveram um significativo crescimento no número de prefeitos eleitos.

Em SC o resultado foi semelhante em 2016. O PT recuou de 47 para 20 prefeituras (-57,4%) PDT de 7 para 3 (-57,1%) ao passo que o PSDB obteve um crescimento de 46% saltando de 26 para 38 prefeituras. Já o partido do então governador saltou de 52 para 59 municípios administrados a partir de 2016. Nos dois pleitos o PMDB manteve sua hegemonia como o partido que administra o maior número de cidades catarinenses.

Gráfico – Prefeitos eleitos por partido – 2012/2016


Em Joinville o PT deixou de eleger vereador depois de vários anos.  Na maior cidade do Estado o PMDB (Udo Dohler) e o partido do então governador - PSD  - (Darci) protagonizaram um segundo turno vencido com ampla margem pelo segundo. Udo levou vantagem na zona norte do município e em bairros centrais, Já Darci saiu-se melhor na zona sul e bairros periféricos.

As eleições de 2020 sobrevém em um cenário muito distinto. Muito embora a grande marca desta eleição será a imprevisibilidade e a incerteza cabe ressaltar, contudo, que o resultado não é de todo imprevisível se olharmos para os indicadores corretos. Como fatores preditivos do resultado as variáveis que seguem podem ser observadas:

1 – Bolsonaro - O resultado eleitoral de 2018 implodiu todas as previsões. A eleição de Bolsonaro pegou muitos dos melhores analistas no contrapé. Era uma eleição muito improvável. Mas ele venceu o primeiro turno e não teve dificuldades em reunir todos os elementos a seu favor para vencer o segundo turno. Elementos dos quais vale destacar a) o forte antipetismo que correspondeu a um vácuo político por ele aproveitado; b) exponenciado pela lava jato que anulou outros partidos tradicionais no primeiro turno. Uma vez no poder Bolsonaro tem mantido padrões estáveis de aprovação. Ele ainda é um cabo eleitoral de peso e uma variável que pode beneficiar candidatos que colem em sua imagem, diretamente, ou indiretamente encampando pautas comuns. Esse peso pode ser medido, por exemplo, no processo de impeachment do governador que depois de romper abertamente com o Governo Bolsonaro foi abandonado à própria sorte pelos eleitores que outrora lhe sufragaram os votos para vencer o pleito de 2018.

2 - Alterações eleitorais – As regras eleitorais mudaram profundamente em relação às eleições de 2016. A mais sensível, certamente, foi o fim da possibilidade de coligações proporcionais. Assim, partidos menores não poderão somar forças para tentar vencer o quociente eleitoral. O efeito mais direto disso foi uma explosão de candidaturas generalizada (já que um maior n. de candidatos torna, matematicamente mais fácil alcançar esse valor mínimo de votos). É fácil concluir que para o eleitor este é um cenário complicado. Uma vez que torna-se difícil votar de modo informado quando no cardápio eleitoral apresentam-se seis centenas de candidaturas.

Por outro lado, sabe-se que o eleitor toma atalhos cognitivos para facilitar o processo decisório. Votar em um partido determinado, no candidato apoiado pelo presidente ou pelo governador ou ainda em um candidato já conhecido pode se tornar uma forte determinante nesse cenário. Da mesma forma ante a grande polarização política que tem dividido a sociedade brasileira, escolher entre um candidato identificado ideologicamente também pode ser relevante na cabeça do eleitor nestas eleições. O antipetismo é sintoma deste aspecto.

3 - Governador neutralizado – Uma variável que normalmente tem peso em uma eleição é o apoio e a mobilização do Governador e de seu partido. Em Santa Catarina diante da situação de isolamento político de Carlos Moises (Sem partido) esta deve ser uma variável a ser considerada. Ou seja, um cenário em que o apoio do Governador não deve interferir na decisão do eleitor.

4 – Pandemia – Cabe acompanhar a evolução da doença no Estado. A pandemia do coronavírus pode aumentar as taxas de abstenção eleitoral. As pesquisa de opinião pública  tem captado uma crescente descrença da população com as instituições de modo geral e particularmente com a democracia. As pessoas não se sentem mais representadas pelo parlamento além disso um percentual crescente a cada ano concorda que formas não democráticas seriam desejáveis para resolver problemas como a insegurança ou a corrupção.

Some-se a isso escândalos de corrupção, impunidade e o fato de que desde a transição para a democracia a américa latina não havia se vivido um período tão convulsionado politicamente têm-se elementos suficientes para implodir as taxas de comparecimento às urnas com a potencialidade de formar a tempestade perfeita. Ou seja, um cenário com índices recordes de abstenção eleitoral.  Cabe perceber quais as consequências disto para o país, para o estado, a cidade, para a democracia como um todo. A meu ver, o resultado mais direto e evidente seria a eleição de políticos e partidos ainda mais afastados do interesse da população de modo geral, o que poderia levar a um aprofundamento da crise de representatividade um distanciamento ainda maior das pessoas. No longo prazo esse é um panorama preocupante. Ainda mais quando nunca se falou tanto no fim das democracias como nos dias que correm.

5 - Aprovação do prefeito – uma variável que costuma ser uma excelente preditora do voto é a taxa de aprovação da administração atual. Saber o que pensa o cidadão de Joinville sobre a administração do atual prefeito pode ajudar a predizer como ele deverá se comportar nas urnas muito mais do que qualquer outra variável. A máxima é que prefeitos com taxas de aprovação elevadas costumam fazer o sucessor. Por outro lado, quando as taxas de rejeição é que são altas ganha a simpatia aquele candidato que conseguir posicionar-se como o opositor mais evidente na cabeça do eleitor.

6  - A cabeça do eleitor  - Eleitor já havia indicado em 2014 suas preferências mais à direita. A câmara de deputados eleita em 2014 continha 75% dos partidos/candidatos identificados com pautas à direita segundo estudo realizado controlando as votações em plenário durante o ano de 2015.

O que mudou em 2018 é que os partidos tradicionais à direita não souberam fazer esta leitura. Ou seja, de que o eleitor naquele momento estava propenso a apoiar pautas conservadores e menos progressistas. Assim Bolsonaro aparentemente fazendo esta leitura apostou em uma agenda contendo pautas morais, relativas aos costumes e crenças de parcela deste eleitorado atraindo para si (extrema direita) estes votos.

Fora a pandemia não há nada que indique que a cabeça do eleitor mudou muito de 2018 para 2020. Na verdade, a pandemia nublou os resultados econômicos de algumas das medidas mais à direita adotadas pelo governo desde 2016 para cá (reforma trabalhista, reforma previdenciária, teto de gastos). Então não há como saber se o desemprego e a recessão econômica se devem a estas medidas ou à pandemia. O governo neste caso, na cabeça do eleitor, tem o benefício da dúvida e não se lhe credita estes efeitos às suas políticas, por enquanto.