Fui provocado pelo jornalista Hassan do Jornal AN a escrever sobre o processo político eleitoral de 2020.
Segue abaixo, em primeira mão, o extrato da entrevista enviada e que deve ir ao publico ao longo da próxima semana:
Muita coisa mudou em relação
ao cenário político de 2016. Naquela eleição Temer era o presidente e o país
acabara de passar por um impeachment. Bolsonaro era ainda um azarão e poucos
apostavam em sua eleição. Sem dúvidas o que marcou a cabeça do eleitor naquele
pleito foi um forte sentimento de rejeição ao PT e um otimismo com os rumos da operação
Lava Jato. Outro fator ainda marcante era a polarização PSDB/PT como rescaldo
ainda das eleições presidenciais de 2 anos antes. Observando o resultado
eleitoral em 2016 o recuo de partidos tradicionais foi nítido: o PT encolheu no
número de prefeituras em quase 60% caindo de um total de 630 para 256
municípios administrados (1º turno). PMDB, PSDB, mantivera-se estáveis enquanto partidos
sem expressão política deram os primeiros indícios que a cabeça do eleitor
estava mudando. Partidos considerados nanicos como PHS (125%) PSL (30%) PTN
(150%) tiveram um significativo crescimento no número de prefeitos eleitos.
Em SC o resultado foi
semelhante em 2016. O PT recuou de 47 para 20 prefeituras (-57,4%) PDT de 7
para 3 (-57,1%) ao passo que o PSDB obteve um crescimento de 46% saltando de 26
para 38 prefeituras. Já o partido do então governador saltou de 52 para 59
municípios administrados a partir de 2016. Nos dois pleitos o PMDB manteve sua
hegemonia como o partido que administra o maior número de cidades catarinenses.
Gráfico – Prefeitos eleitos por partido – 2012/2016
Em Joinville o PT deixou de eleger
vereador depois de vários anos. Na maior
cidade do Estado o PMDB (Udo Dohler) e o partido do então governador - PSD - (Darci) protagonizaram um segundo turno vencido
com ampla margem pelo segundo. Udo levou vantagem na zona norte do município e
em bairros centrais, Já Darci saiu-se melhor na zona sul e bairros periféricos.
As eleições de 2020 sobrevém
em um cenário muito distinto. Muito embora a grande marca desta eleição será a imprevisibilidade
e a incerteza cabe ressaltar, contudo, que o resultado não é de todo imprevisível se olharmos para os indicadores corretos. Como fatores preditivos do resultado as
variáveis que seguem podem ser observadas:
1 – Bolsonaro - O resultado
eleitoral de 2018 implodiu todas as previsões. A eleição de Bolsonaro pegou
muitos dos melhores analistas no contrapé. Era uma eleição muito improvável.
Mas ele venceu o primeiro turno e não teve dificuldades em reunir todos os elementos
a seu favor para vencer o segundo turno. Elementos dos quais vale destacar a) o
forte antipetismo que correspondeu a um vácuo político por ele aproveitado; b) exponenciado
pela lava jato que anulou outros partidos tradicionais no primeiro turno. Uma
vez no poder Bolsonaro tem mantido padrões estáveis de aprovação. Ele ainda é
um cabo eleitoral de peso e uma variável que pode beneficiar candidatos que
colem em sua imagem, diretamente, ou indiretamente encampando pautas comuns.
Esse peso pode ser medido, por exemplo, no processo de impeachment do
governador que depois de romper abertamente com o Governo Bolsonaro foi
abandonado à própria sorte pelos eleitores que outrora lhe sufragaram os votos
para vencer o pleito de 2018.
2 - Alterações eleitorais – As
regras eleitorais mudaram profundamente em relação às eleições de 2016. A mais
sensível, certamente, foi o fim da possibilidade de coligações proporcionais.
Assim, partidos menores não poderão somar forças para tentar vencer o quociente
eleitoral. O efeito mais direto disso foi uma explosão de candidaturas generalizada
(já que um maior n. de candidatos torna, matematicamente mais fácil alcançar
esse valor mínimo de votos). É fácil concluir que para o eleitor este é um
cenário complicado. Uma vez que torna-se difícil votar de modo informado quando
no cardápio eleitoral apresentam-se seis centenas de candidaturas.
Por outro lado, sabe-se que o
eleitor toma atalhos cognitivos para facilitar o processo decisório. Votar em
um partido determinado, no candidato apoiado pelo presidente ou pelo governador
ou ainda em um candidato já conhecido pode se tornar uma forte determinante
nesse cenário. Da mesma forma ante a grande polarização política que tem
dividido a sociedade brasileira, escolher entre um candidato identificado ideologicamente
também pode ser relevante na cabeça do eleitor nestas eleições. O antipetismo é
sintoma deste aspecto.
3 - Governador neutralizado –
Uma variável que normalmente tem peso em uma eleição é o apoio e a mobilização
do Governador e de seu partido. Em Santa Catarina diante da situação de isolamento
político de Carlos Moises (Sem partido) esta deve ser uma variável a ser
considerada. Ou seja, um cenário em que o apoio do Governador não deve
interferir na decisão do eleitor.
4 – Pandemia – Cabe acompanhar
a evolução da doença no Estado. A pandemia do coronavírus pode aumentar as
taxas de abstenção eleitoral. As pesquisa de opinião pública tem captado uma crescente descrença da
população com as instituições de modo geral e particularmente com a democracia.
As pessoas não se sentem mais representadas pelo parlamento além disso um
percentual crescente a cada ano concorda que formas não democráticas seriam
desejáveis para resolver problemas como a insegurança ou a corrupção.
Some-se a isso escândalos de
corrupção, impunidade e o fato de que desde a transição para a democracia a
américa latina não havia se vivido um período tão convulsionado politicamente
têm-se elementos suficientes para implodir as taxas de comparecimento às urnas
com a potencialidade de formar a tempestade perfeita. Ou seja, um cenário com índices
recordes de abstenção eleitoral. Cabe perceber
quais as consequências disto para o país, para o estado, a cidade, para a
democracia como um todo. A meu ver, o resultado mais direto e evidente seria a
eleição de políticos e partidos ainda mais afastados do interesse da população
de modo geral, o que poderia levar a um aprofundamento da crise de
representatividade um distanciamento ainda maior das pessoas. No longo prazo
esse é um panorama preocupante. Ainda mais quando nunca se falou tanto no fim
das democracias como nos dias que correm.
5 - Aprovação do prefeito – uma
variável que costuma ser uma excelente preditora do voto é a taxa de aprovação
da administração atual. Saber o que pensa o cidadão de Joinville sobre a administração
do atual prefeito pode ajudar a predizer como ele deverá se comportar nas urnas
muito mais do que qualquer outra variável. A máxima é que prefeitos com taxas
de aprovação elevadas costumam fazer o sucessor. Por outro lado, quando as
taxas de rejeição é que são altas ganha a simpatia aquele candidato que
conseguir posicionar-se como o opositor mais evidente na cabeça do eleitor.
6 - A cabeça do eleitor - Eleitor já havia indicado em 2014 suas
preferências mais à direita. A câmara de deputados eleita em 2014 continha 75%
dos partidos/candidatos identificados com pautas à direita segundo estudo
realizado controlando as votações em plenário durante o ano de 2015.
O que mudou em 2018 é que os
partidos tradicionais à direita não souberam fazer esta leitura. Ou seja, de
que o eleitor naquele momento estava propenso a apoiar pautas conservadores e
menos progressistas. Assim Bolsonaro aparentemente fazendo esta leitura apostou
em uma agenda contendo pautas morais, relativas aos costumes e crenças de
parcela deste eleitorado atraindo para si (extrema direita) estes votos.
Fora a pandemia não há nada que
indique que a cabeça do eleitor mudou muito de 2018 para 2020. Na verdade, a
pandemia nublou os resultados econômicos de algumas das medidas mais à direita
adotadas pelo governo desde 2016 para cá (reforma trabalhista, reforma
previdenciária, teto de gastos). Então não há como saber se o desemprego e a
recessão econômica se devem a estas medidas ou à pandemia. O governo neste caso,
na cabeça do eleitor, tem o benefício da dúvida e não se lhe credita estes
efeitos às suas políticas, por enquanto.