Consumado o "impeachment" contra o presidente paraguaio Fernando Lugo. Democraticamente eleito, foi retirado do poder em uma manobra relâmpago no parlamento que mal-disfarça o caráter golpista e violador da democracia.
Foram menos de 48 horas entre a abertura o processo de afastamento e sua votação, em um processo sumário que não resguardou os menores preceitos de defesa que se esperaria em uma situação destas. Já empossado o novo presidente, Federico Franco, vice-presidente de Lugo e participe do golpe, assume com uma forte ilegitimidade. A reação da maioria dos países da América Latina foram de duras críticas.
Entre os sócios do Paraguai no Mercosul (Brasil, Argentina e Uruguai), que realiza sua cúpula na próxima quinta e sexta-feira, em Mendoza, Argentina, a declaração mais dura foi justamente a da presidente deste país, Cristina Kirchner. "Sem dúvidas houve um golpe de Estado" no Paraguai, e considera que isto "reedita situações que acreditávamos que estavam absolutamente superadas na América do Sul e na região em geral".
O presidente uruguaio, José Mujica, afirmou que estava "profundamente entristecido" pela destituição de Lugo, o presidente da Venezuela, Hugo Chávez, advertiu que "não reconhece este irritante, ilegal e ilegítimo governo que se instalou em Assunção". O presidente da Bolívia, Evo Morales, assegurou que "não reconhecerá um governo que não surja das urnas e do mandato do povo". O México, considerou que embora o julgamento político de sexta-feira no Congresso "tenha se desenvolvido seguindo o procedimento estabelecido no texto constitucional paraguaio", "não concedeu ao ex-presidente Lugo os espaços e tempos para a devida defesa", expressou a chancelaria.
Presidente Federico Franco, empossado após o golpe |
O Equador, Cuba, a República Dominicana e inúmeros outros países da região também já se pronunciaram afirmando que não reconheceram a legitimidade deste governo. A Comissão Interamericana de Direitos Humanos (CIDH) afirmou que é "inaceitável a rapidez do julgamento político contra o presidente constitucional e democraticamente eleito", afirmou em um comunicado a Comissão, órgão autônomo da Organização de Estados Americanos (OEA), ao destacar que o procedimento "afeta a vigência do Estado de Direito no Paraguai".
E quanto ao Brasil? Infelizmente, até o momento, foram poucas e evasivas as declarações vindas do governo brasileiro. Até o momento em que escrevo estas linhas (23/06), nenhuma posição oficial foi publicizada, nenhum pronunciamento da presidenta Dilma condenando e posicionando-se frente ao golpe instalado no Paraguai. Qual o motivo desta postura vacilante? Será que o governo brasileiro não percebe a gravidade da situação? Será que o governo desconhece os reais motivos que levaram a esta ação do parlamento paraguaio, que destituiu um presidente legitimamente eleito, para preservar seus interesses, alheios ao da maioria da população?
O Brasil ocupa uma posição chave nesta contenda, uma posição titubeante pode ser decisivo para legitimar um governo golpista (que já sabemos que contará com a anuência dos EUA) e pode colocar em curso uma nova "onda golpista" em nosso continente. A América Latina já teve um ensaio disto em Honduras, quando foi destituído, de forma similar o presidente Manuel Zelaya em 2009.
Presidente Lugo com a Presidenta Dilma em reunião da Unasul |
Até este momento, o governo brasileiro afirma que esperará uma posição conjunta da Unasul para posicionar-se, o que é uma forma de esquivar-se de uma situação que não pode haver vacilos.
Posicionar-se politicamente, neste momento, é um dever do Brasil, não é aceitável uma postura vacilante de um país que se projeta como liderança mundial. O silêncio já é uma forma de legitimar o golpe.
Em Tempo: O governo brasileiro, em nota emitida ao final deste sábado (23/06), através do ministério das Relações Exteriores, afirmou que condena o impeachment do presidente Fernando Lugo. A nota diz ainda que o Mercosul e a Unasul avaliam medidas a serem aplicadas devido à ruptura da ordem democrática, mas afirma que o governo brasileiro não tomará medidas que prejudiquem “o povo irmão do Paraguai”. Além disso, a nota não afirma se o Brasil reconhece ou não a legitimidade do novo presidente, Federico Franco, empossado após o golpe. Uma postura mais critica e protagonista, como a adotada pelo presidente Lula na ocasião do golpe de Honduras, parece não ser o caminho escolhido pelo governo Dilma. Qual a estratégia que a presidenta Dilma adotará, se assumirá uma posição de protagonismo nesta crise, mas de forma mais discreta ou se relegará tudo ao Itamaraty e a diplomacia é uma questão em aberto.
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