Foi necessária uma explicação ao senador Rodrigo Rollemberg (PSB-DF) em palestra proferida ontem pelo presidente do Supremo Tribunal Federal para que ficasse claro que ali estava o professor Joaquim Barbosa, e não o ministro.
A distinção é necessária em razão do teor de sua visão sobre o Parlamento e acerca dos partidos políticos.
Para o professor Barbosa, as legendas são "mentirinhas" que transformam o Congresso em um Poder ineficiente e dominado pelo Executivo. A ideia não representa qualquer novidade se consideradas pesquisas de opinião e parte dos estudos científicos sobre o tema.
Na defesa sobre a posição polêmica sobre os partidos Barbosa parece mirar no que vê -a relação entre Executivo e Legislativo e o enfraquecimento dos partidos- e acertar no que não vê, atingindo a Justiça.
Lembremos que foi o STF que artificializou o quadro partidário com a verticalização de 2002. Que em 2006 julgou inconstitucional a cláusula que visava à limitação das benesses concedidas às legendas. Que flexibilizou, em 2011, sua própria visão de fidelidade partidária para o nascimento do PSD.
Foi, por fim, a Justiça que recentemente barrou o desejo do Parlamento de cumprir seu papel legislador sob a decisão unilateral de Gilmar Mendes, capaz de conturbar ainda mais a confusão em torno da criação de legendas.
Diante de tais aspectos não parece ser apenas o Executivo a furtar o Legislativo de seu papel. Não há no país Poder mais criativo em matéria eleitoral que o Judiciário. Assim, que o professor Barbosa seja capaz de observar que o órgão que preside contribui para reforçar a "mentirinha" chamada "partido político".
HUMBERTO DANTAS é cientista político e professor do Insper.
Ainda sob o efeito das recentes rusgas entre o Judiciário e o Legislativo, o presidente do STF (Supremo Tribunal Federal), Joaquim Barbosa, afirmou nesta segunda-feira que os partidos políticos são de "mentirinha" e que o Congresso Nacional é "ineficiente" e "inteiramente dominado pelo Poder Executivo".
As declarações foram feitas durante uma palestra proferida no IESB (Instituto de Educação Superior de Brasília), instituição da qual é professor.
"Nós temos partidos de mentirinha. Nós não nos identificamos com os partidos que nos representam no Congresso, a não ser em casos excepcionais. Eu diria que o grosso dos brasileiros não vê consistência ideológica e programática em nenhum dos partidos. E tampouco seus partidos e os seus líderes partidários têm interesse em ter consistência programática ou ideológica. Querem o poder pelo poder", disse ao responder a pergunta de um aluno sobre a suposta interferência do Judiciário em assuntos do Legislativo.
Sergio Lima-10.dez.12/Folhapress |
Ministro Joaquim Barbosa no plenário do STF |
"Está é uma das grandes deficiências, a razão pela qual o Congresso brasileiro se notabiliza pela sua ineficiência, pela sua incapacidade de deliberar", disse o ministro.
O presidente do Supremo afirmou também que o poder, quando não é exercido, acaba "tomado, exercido por outrem". "Em grande parte no Brasil esse poder é exercido pelo Executivo".
As críticas ao Legislativo continuaram ao longo da palestra, quando Barbosa voltou a falar sobre os problemas do Congresso. "O problema crucial brasileiro, a debilidade mais grave do Congresso brasileiro, é que ele é inteiramente dominado pelo Poder Executivo", afirmou. "O Congresso não foi criado para única e exclusivamente deliberar sobre o Poder Executivo. Cabe a ele a iniciativa da lei. Temos um órgão de representação que não exerce em sua plenitude o poder que a Constituição lhe atribui, que é o poder de legislar", afirmou Barbosa, sob o aplauso dos presentes.
Ao longo de sua palestra, quando tratava sobre regras e limites impostos aos Poderes para evitar excessos de um sobre os outros (freios e contrapesos), Barbosa citou a votação da semana passada, que aprovou a Medida Provisória dos Portos, como um "contraexemplo" desses limites.
"Os excesso da Câmara dos Deputados podem ser controlados pelo Senado Federal. Ou seja, o Senado, como é um órgão composto por pessoas mais idosas, experientes, em geral ex-governadores, poderia controlar, conter os excessos e saliências da Câmara dos Deputados", explicou.
"Mas olha, nós tivemos na semana passada um contraexemplo disso. Uma Medida Provisória de extrema urgência teve seu tempo de exame de deliberação esgotado na Câmara até o último dia. E o Senado só teve algumas horas para se debruçar sobre aquele o texto. Daí se vê a dificuldade de configuração desse controle do Senado sobre a Câmara dos Deputados na nossa experiência."
VOTO DISTRITAL
Barbosa ainda defendeu a mudança do atual sistema político que, segundo ele, possibilita a escolha de representantes desconhecidos do povo. "O Poder Legislativo, especialmente a Câmara dos Deputados, é composto em grande parte por representantes pelos quais não nos sentimos representados por causa do sistema eleitoral que não contribui para que tenhamos uma representação clara, legítima. Passados dois anos da eleição ninguém sabe mais em quem votou. Isso vem do sistema proporcional", [barbosa não leu Kelsen, que em A Democracia defende o sistema prioporcional como o único compatível com a democracia] disse, defendendo a adoção do voto distrital para os deputados federais.
Para o presidente do Supremo, "o sistema distrital permitiria uma qualificação do Congresso Nacional. Cada distrito poderia escolher pessoas, personalidades que poderiam dar grande contribuição ao país. Tenho certeza de que a representação nacional ganharia e muito com a representação dessas pessoas em qualidade".
"Hoje temos um Congresso dividido em interesses setorizados Há uma bancada evangélica, uma do setor agrário, outra dos bancos. Mas as pessoas não sabem isso, porque essa representatividade não é clara", finalizou.
Também na mesa dos palestrantes, o senador Rodrigo Rollemberg (PSB-DF) defendeu o atual sistema, argumentando que o voto distrital puro poderia prejudicar a representação de minorias nos Congressos, além de priorizar assuntos locais, deixando de lado temas nacionais.
"O nosso Congresso Nacional é reflexo da sociedade brasileira, representa o Brasil com suas qualidades e seus defeitos. É o Poder mais cobrado de todos", rebateu.
Barbosa, então, explicou ao senador que estava falando não como presidente do Supremo, mas como um professor universitário.
As críticas, no entanto, continuaram. O ministro do STF afirmou, por exemplo, que a proposta de emenda constitucional que limita os Poderes da Corte,"significaria o fim da Constituição de 1988".
"Se levadas adiante essas tentativas, nós teríamos destruída a Constituição brasileira, todo mecanismo de controle de constitucional que o Supremo exerce sobre as leis. Significaria o fim da Constituição de 88, eliminaria o controle judicial", afirmou.
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