quarta-feira, 13 de novembro de 2013

Presença do movimento sindical na política brasileira


Jornal ANotícia - 13 de novembro de 20130
Este ensaio objetiva fazer uma breve análise do movimento sindical brasileiro. É presente no campo jornalístico e até mesmo entre sindicalistas e teóricos a visão de que o movimento sindical encontra-se em fase de declínio. Contudo, os analistas mais atentos dão notícia do vigor do sindicalismo brasileiro, principalmente a partir de 2004. José Dari Krein argumenta que a tese hegemônica existente nos anos 1990, de flexibilização das relações de trabalho, foi perdendo força com a melhora dos indicadores do mercado de trabalho, especialmente após 2004. Outros dois conhecidos estudiosos do movimento sindical, Boito Jr e Marcelino, rechaçam abertamente a ideia de declínio do movimento sindical. Para eles, pelo menos desde 2004, é presente uma conjuntura de recuperação da atividade sindical no Brasil.
Os dados mais recentes do Dieese (2012) também confirmam a tendência de recuperação da vitalidade do sindicalismo. Em 2012, o SAG-Dieese registrou 873 greves. As informações da série histórica também revelam que o total de greves cadastrado em 2012 é o maior verificado desde 1997. Analistas costumam advertir que as greves não podem ser tomadas como indicador isolado do grau de vitalidade do movimento sindical. Nesse sentido, os dados do Dieese para 2012 demonstram que, além da manutenção da tendência ao aumento do movimento grevista, foram noticiadas ações de grevistas em 58% dos casos. As ações dos grevistas abrangeram assembleias e atos públicos (486 casos), passeatas (107 casos), piquetes (46 casos). Houve ainda a realização de acampamentos em 28 greves; de ocupações em 25; e de vigílias, em 11 casos.
Longe de caminhar para o seu declínio, parece que o movimento sindical, a despeito do processo de exclusão e criminalização ideológica perpetrada pela onda neoliberalizante, mostra um vigor comparável àquele do seu florescimento na década de 1980 no Brasil.
JEISON GIOVANI HEILER | MESTRE EM SOCIOLOGIA POLÍTICA E DOUTORANDO EM CIÊNCIA POLÍTICA
Versão completa:
Presença do movimento sindical na política brasileira

            Este ensaio objetiva fazer uma breve análise do movimento sindical brasileiro a partir de três abordagens distintas: o trabalho de Boito Jr. e Marcelino (2010) que discute a crise no movimento sindical nos anos 90, um segundo trabalho abordando transformações nas configurações estruturais nas centrais sindicais (GALVÃO, 2012), e um terceiro trabalho abordando o movimento de flexibilização das relações de trabalho (KREIN, et al, 2012). Analisaremos também os últimos dados divulgados pelo DIEESE[1] sobre o panorama das greves no Brasil. No primeiro passo indicaremos brevemente o debate contido em cada um dos trabalhos para em seguida procurar indicar o diagnóstico comum às abordagens, concluindo com questionamentos que podem surgir desse debate.

            O artigo de Amando Boito Jr. e Paula Marcelino (2010) discute a vitalidade do movimento sindical brasileiro. Amplamente amparados em dados sobre as Greves do DIEESE sustentam a tese de que a) o sindicalismo não está em fase de declínio, concepção erroneamente sustentada por alguns pesquisadores,  b) apontam o período da década de 90 como período de crise sindical no Brasil e c) que a partir dos anos 2000 o movimento sindical apresenta uma fase ascendente de recuperação, presente nas manifestações grevistas de cunho ofensivo com efetivo ganho salarial para as classes trabalhadoras, não afetado nem mesmo pela crise de 2008 na economia internacional.

            Andréia Galvão (2012) aborda a reconfiguração do movimento sindical nos governos Lula concluindo que houve um aprofundamento da divisão organizativa que pode ter dois significados opostos: de um lado, pode ser um indicativo de vitalidade, "pois foi a forma encontrada por uma parcela do movimento sindical para manifestar sua  insatisfação  e  seu  descontentamento  tanto  em  relação  ao  governo  quanto  em relação às centrais sindicais próximas a ele". De outro lado, parece expressar uma tendência à acomodação política, "já que algumas organizações foram criadas em decorrência das mudanças introduzidas pelo governo na legislação sindical, de modo a se adequar a essas mudanças e se aproveitar dos benefícios por elas introduzidos. Essa acomodação política verificada na cúpula do sindicalismo brasileiro contrastada com certa vitalidade da base" (2012, p. 189).

            A abordagem de José Dari Krein et al (2012) observa as alterações nas relações de trabalho durante os governos Lula apontando sinais contraditórios em relação à flexibilização de direitos, que era a tendência predominante desde os anos 1990. Depois de fazer um balanço das medidas legislativas flexibilizadoras e outras que tendem a reforçar a perspectiva de ampliar a regulação pública do trabalho sustenta que “No balanço geral, fica evidente que a reforma trabalhista não teve grande destaque no Governo Lula" (2012, p. 25). Concluem os autores ainda que diante dos indicadores apresentados a tese da flexibilização se mostrou equivocada e dispensável para geração empregos, formalização, elevação de salários, estruturação do mercado e relações de trabalho (2012, p. 24).

            Apontadas as principais questões de cada trabalho, procuraremos explorar agora em que medida estas três abordagens podem dialogar. Como elemento comum evidentemente as três abordagens tratam do movimento sindical brasileiro. A argumentação de José Dari Krein et al (2012) de que a tese hegemônica existente nos anos 1990 de flexibilização das relações de trabalho foi perdendo força com a melhora dos indicadores do mercado de trabalho[2], especialmente após 2004, confirma a tese de Boito Jr e Marcelino (2010) que rechaçam a ideia de declínio do movimento sindical. Para estes últimos, pelo menos desde 2004 é presente uma conjuntura de recuperação da atividade sindical no Brasil. Tese que é amparada também pelo trabalho de Andreia Galvão (2012) ao indicar o surgimento de novas centrais sindicais durante o governo Lula como consequência do acirramento político no período. Portanto, os três trabalhos, por diferentes vias, partilham de um diagnóstico positivo do sindicalismo brasileiro desde a eleição de Lula em 2002.

            As conclusões de Galvão endossam ainda a conclusão de Boito Jr e Marcelino de que constitui um erro analítico analisar o sindicalismo e a classe operária separadamente no processo político.  Galvão pressupõe na sua análise que as orientações e as posições político-ideológicas assumidas pelas centrais sindicais estão relacionadas às suas bases sociais, daí porque faz a opção analítica de observar os setores econômicos em que estão inseridas e as categorias profissionais que congregam as centrais.

            Os dados mais recentes do DIEESE (2012) por outro turno confirmam as tendências apontadas pelos três trabalhos aqui discutidos. Efetivamente o movimento sindical brasileiro não foi atingido pela crise de 2008, e, na verdade ele experimentou um crescimento no campo de ação grevista em constante elevação:

Em 2012, o SAG-DIEESE registrou 873 greves. O resultado confirma a tendência de aumento do número de greves verificada a partir de 2008. As informações da série histórica também revelam que o total de greves cadastrado em 2012 é o maior verificado desde 1997. (DIEESE, 212, p. 2)

            Boito Jr. (2010) adverte que as greves não podem ser tomadas como indicador isolado do grau de vitalidade do movimento sindical, nesse sentido, os dados do DIEESE para 2012 demonstram que além da manutenção da tendência ao aumento do movimento grevista foram noticiadas ações de grevistas em 58% dos casos. As ações dos grevistas abrangeram assembleias e atos públicos (486 casos), passeatas (107 casos), piquetes (46 casos). Houve ainda a realização de acampamentos em 28 greves, de ocupações, em 25, e de vigílias, em 11. Os dados do DIEESE indicam ainda que em 75% dos casos os movimentos tiveram algum êxito nas suas reivindicações.

            Portanto, os dados afastam a ideia de que a vitalidade do movimento sindical seja proporcional ao crescimento econômico e vice-versa[3] já que é imediatamente no cenário pós-crise internacional de 2008 que o movimento sindical experimenta um largo crescimento grevista no Brasil[4].

            Caberia saber em que medida o declínio ideológico da matriz de pensamento neoliberal foi afetado pela crise de 2008 e em outro passo, até que ponto esse declínio pode ter exercido alguma influência na retomada do vigor do movimento sindical brasileiro.

            Por ora, resta da análise dos artigos aqui comentados e dos recentes dados do DIEESE, que não é possível falar do movimento sindical sem tratar de outras variáveis sociais, econômicas e, principalmente, políticas atuantes no processo. Longe de caminhar para o seu declínio parece que o movimento sindical, a despeito do processo de exclusão e criminalização ideológica perpetrada pela onda neoliberalizante de que nos fala Mustapha El Miri[5], mostra um vigor somente comparável àquele do seu florescimento na década de 80 no Brasil[6].·.

            Fica demonstrado também que o governo do PT exerceu forte influência política no movimento sindical. Resta saber, porém, em que medida, estes movimentos atuam no processo de sustentação política do governo e em que medida podem atuar para o aprofundamento das reformas ou para imposição de resistência à [possíveis] novas investidas do neoliberalismo.





[1] Balanço das Greves 2012.
[2] Possível segundo este autor devido principalmente a três medidas adotadas pelo governo Lula: Crescimento econômico manifesto no PIB em elevação a partir de 2004, políticas públicas em especial a elevação do salário mínimo e medidas de transferência de renda e as lutas e conquistas do movimento sindical foram decisivas para acrescentar melhorias ao mercado de trabalho brasileiro.
[3] Boito Jr. alerta para a complexidade da relação entre movimento sindical e crise econômica. (2010, p. 335)
[4] Por outro turno, poder-se-ia contra argumentar que o cenário de crise econômica não abalou a economia interna, que ao contrário, tem demonstrado índices de crescimento na contramão da maré recessiva internacional.

[5] A esse respeito à publicação do autor em BLEITRACH, Danielle; EL MIRI, Mustapha. Defaite ouvriere et exclusion. Ed. L'Harmattan, France. 2000.

[6] Ver a respeito: "Brasil: o movimento sindical e popular na década de dois mil” (BOITO, GALVÃO, MARCELINO) Disponível em: http://politicalatinoamericana.sociales.uba.ar/files/2011/08/galvao-boito-marcelino.pdf

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