Por Jeison Giovani Heiler
Vivemos tempos difíceis. Uma onda de
doenças graves projeta duras sombras sobre o futuro da humanidade. Os
indivíduos vivem dias de medo e incerteza. As relações causais entre os fatos
que se descortinam e os desdobramentos constituem objeto de amplo debate
filosófico. O ilustrado romancista Cortazar já vaticinara a impossibilidade de
saber "O que leva a uma coisa. O outro lado de uma coisa, e o mistério
que a trouxe para ser o que é". Daí que não possamos afirmar que deste
cenário é que decorre a atual atribuição patologizante a posicionamentos
políticos desferida por alguns contra indivíduos em posição política oposta.
Antes o pudéssemos dizê-lo. Não raro, ouvem-se expressões tais como "Esquerdopatas"
ou "PTralhas" para designar os partidários do pensamento de
esquerda. Este é um fenômeno que não pode ser desprezado. Desde as
manifestações de julho de 2013 estão presentes dois comportamentos ambíguos em
parte da sociedade brasileira. Uma crescente indiferença em relação aos fatos
políticos convive com uma escalada de ódio destilada contra aqueles que possuem
convicções políticas distintas. A atribuição patologizante a comportamentos
disruptivos nunca foi novidade na história do comportamento humano. O
preocupante é que seu aparecimento em larga escala sempre se deu em momentos
delicados da civilização. Durante a idade média, no apogeu da inquisição,
mulheres cujo comportamento contrariasse a moral cristã eram içadas às
fogueiras. No holocausto entre as vítimas não judias do genocídio estavam
ciganos, comunistas, homosexuais, deficientes físicos e mentais e até artistas
do modernismo, surrelaismo, dadaísmo e do expressionismo considerados
"degenerados" pelos nazistas. Gênios hoje reconhecidos do porte
de Chagall, Paul Klee ou Kandisnky eram considerados por Hitler "um
perigo público que devem ficar sob supervisão médica". O que faz com
que uns sintam-se no direito de atribuir a outros rótulos patologizantes é fato
conhecido da antropologia sob o nome de estranhamento. É sabido que todo
estranhamento pode desencadear comportamentos de recusa capazes de fornecer
justificativas para o colonialismo, dominação, exploração, conquista e
escravização do outro. Entender que estamos diante de um mero fenômeno
primaveril, é uma esperança que precisamos alimentar. Mas, sem descuidar de que
a jovem experiência democrática brasileira precisa aprender a conjugar a
alteridade, que se resume na inclusão do outro, com suas convicções, suas
diferenças, como condição salutar ao amadurecimento do debate político e da
democracia
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