sexta-feira, 1 de abril de 2016

PMDB, PT e o caleidoscópio partidário

HUMBERTO DANTAS
29 Março 2016 | 17:28
Imagine a figura de um caleidoscópio. No fundo de nosso tubo, peças de apenas duas cores, simbolizadas aqui por PT e PMDB, os partidos que mais elegeram deputados federais em 2014 – respectivamente 68 e 66 – e hoje as duas maiores bancadas individuais da Câmara, com 68 peemedebistas e 58 petistas.
Gire o tubo contra a luz e, na Câmara dos Deputados, verás que, onde as legendas avançaram para um divórcio que deverá resultar na aprovação do impeachment de Dilma Rousseff, desde agosto de 2015, a tendência de adesão do PMDB à posição do líder do governo em votações nominais é crescente. Saiu da casa dos 70 pontos cravados e hoje está em 87%. A média do segundo mandato de Dilma é de 76%, longe do que sugeririam os números de um partido de oposição. A despeito disso: a figura formada é de distanciamento.
Gire novamente e, nas cidades, PT e PMDB foram as únicas legendas que participaram, com candidatos próprios ou apoiando terceiros, de mais de cinco mil pleitos para prefeito em 2012. Formaram também a única dupla que esteve coligada em mais de duas mil cidades brasileiras, sendo que em 813 o candidato era do PMDB (40% do total) e em 417 eram do PT (21%). A vitória dos peemedebistas apoiados por petistas ocorreu em 444 cidades (aproveitamento de 55%) e o sucesso do PT com o PMDB na chapa veio em 227 locais (54%). Em 2012, os dados da união dessas duas legendas, quando comparados às eleições de 2000, é 188% maior. A figura aqui é de aliança, mas há quem diga que o afastamento ocorrerá em 2016.
Gire outra vez e talvez o maior problema esteja nos estados. Em 2010, a chapa Dilma e Temer, em busca de aliados, protagonizou o lançamento do menor número de candidatos a governador de PT (10) e PMDB (13) desde 1994. Bem diferente dos 24 petistas de 2002 e dos 18 peemedebistas das duas eleições dos anos 90. Assim, em 2010 “apenas” 52% dos eleitores brasileiros viram esses dois parceiros federais como adversários em 11 pleitos estaduais para governador. O índice aumentou para expressivos 75% em 2014, com 17 estados. Em apenas nove, eles apoiavam o mesmo candidato a governador.
Além disso, nas eleições proporcionais para a Câmara, os candidatos de PT e PMDB, os votos de legenda e as votações dos demais partidos de acertos múltiplos ajudaram a eleger 41 deputados federais. Isso representa dizer que 8% da Câmara eleita é fruto de coligações firmadas em sete estados que envolviam PT e PMDB – sendo 16 deputados do PMDB, 14 do PT e outros 11 de oito diferentes partidos. Atualmente, dos 30 petistas e peemedebistas eleitos juntos nas mesmas sete chapas estaduais, 23 estão na Câmara e mantêm-se nas respectivas legendas. Gaguin (TO) saiu do PMDB e foi para o PTN. Os mineiros Weliton Prado e Laudivio Carvalho saíram, respectivamente, do PT para o PMB e do PMDB ao SD. Ainda em Minas, três petistas e um peemedebista estão licenciados para a ocupação de outras funções. Resta, neste caso, saber quem são exatamente seus suplentes, e segundo a lei podemos ter: petistas, peemedebistas, membros do PC do B, do PROS ou do PRB mineiro – ou ainda infiéis beneficiados pela janela constitucional ou pela criação de novas legendas. Por fim, destaque para o Pará, onde PMDB e PT protagonizaram a única aliança exclusiva entre eles para deputado federal em 2014. Elegeram ao todo cinco dos 17 parlamentares do estado. Sob um quociente eleitoral de 220 mil votos e uma votação individual máxima de 143 mil votos, é fato que petistas e peemedebistas paraenses se fundiram de forma absoluta. Herdaram assim o desejo miscigenado de eleitores de ambas as legendas em um sistema que clama, no mínimo, por ajustes que ponham fim às alianças em eleições proporcionais.
Imagine o eleitor fiel ao PT no Pará que deu um voto de legenda que ajudou a eleição de um peemedebista pró impeachment?
O caleidoscópio continua girando e o PMDB anunciou sua saída do governo Dilma. O conflito entre presidente e vice, comum em alguns estados e cidades em tempos recentes, formará uma nova figura que assustará muitos. E, neste caso, o tubo corre o risco de quebrar, com os pequenos pedaços de vidro cegando políticos e parcelas da sociedade.

Diretor voluntário do Movimento Voto Consciente, doutor em Ciência Política pela USP, professor do Insper, coordenador do curso de pós-graduação em Ciência Política da FESP-SP e apresentador da Rádio Estadão. “Esse blog é feito em parceria com o Movimento Voto Consciente. Todos os autores envolvidos são voluntários da organização e dois textos são publicados por semana. As opiniões não espelham, necessariamente, o que pensa o Movimento Voto Consciente, mas carregam, como valor essencial à democracia, a diversidade expressiva de opiniões de seus analistas - todos estudantes, mestres ou doutores em Ciência Política por renomadas universidades. As temáticas terão sempre como base algum aspecto associado ao Legislativo, e podem retratar realidades e desafios municipais, estaduais e-ou federais."

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