domingo, 29 de maio de 2016

Precisamos falar sobre o Supremo

LEON VICTOR DE QUEIROZ

27 Maio 2016 | 17:46

Baiano de Salvador, Aliomar Baleeiro publicou em 1968 juntamente com José Pedroso a obra “O Supremo Tribunal Federal, esse outro desconhecido”. Três anos antes, Baleeiro havia sido indicado e, posteriormente, empossado Ministro do Supremo Tribunal Federal. Presidiu aquela corte de 1971 a 1973. Filiado ao PSD e depois à UDN, Baleeiro fez parte de uma época em que políticos ocupavam postos na Suprema Corte, cuja atuação, até então, não tinha qualquer impacto no processo decisório.
A obra de Baleeiro, na década de 1960, não tinha a dimensão do protagonismo que o STF passaria a ter após a Constituição de 1988. Existem vários trabalhos tratando dos empoderamentos das Cortes Supremas, da expansão global do poder judicial, entre outros. Sempre que o STF é decisivo (quando desempata ou resolve um impasse), ou quando ele diminui ou elimina as incertezas do cenário político, os holofotes se voltam a ele e as críticas surgem.
A primeira crítica é da classe jurídica (não necessariamente a judiciária), formada por advogados públicos e privados, que veem com temeridade o que eles chamam de interferência do Supremo. Falam em usurpação de competências, que o STF legisla, que ele cria regras etc. Nesse cenário, esses críticos defendem que a Suprema Corte fique adstrita ao seu papel de intérprete da Constituição. Mas interpretá-la significa que a hermenêutica pode encontrar em determinado dispositivo uma regra que não está expressa, mas que na interpretação dos ministros ela tem de ser expressa.
A segunda crítica é quando uma decisão do Supremo desfavorece um grupo que passa a atacar o STF argumentando que a corte é política, que as indicações são partidarizadas e que isso macula a sua neutralidade, tornando o STF um tribunal político.
É preciso ter em mente que os três poderes da República são três poderes políticos. São os três poderes que nos governam. Um deles gere a coisa pública, administra o erário, planeja e executa o orçamento, arrecada os tributos, paga, vende, licita e contrata etc. O outro é responsável pela legislação e pela fiscalização da gestão através de Comissões Parlamentares de Inquéritos, dos Tribunais de Contas, e do uso do parlatório para denunciar aquilo que acredita estar em desacordo com a legislação, programa partidário etc. Um terceiro poder político é o que defende a aplicação das normas com base na Constituição, é a última palavra sobre o que é e o que não é constitucional. Trata-se, portanto, do STF.
Os desenhos institucionais de indicação de membros de supremas cortes são os mais variados possíveis. É preciso voltarmos a Lijphart. No clássico modelo de Westminster, não há uma Suprema Corte baseada no Princípio da Supremacia Constitucional. Lá vigora o princípio da Soberania do Parlamento, única instância capaz de definir o processo decisório. Já a Corte norte-americana, cujo desenho institucional data do século XVIII, só passou a ser a última palavra sobre a Constituição a partir de 1803, após a criação do precedente em virtude do famoso caso Marbury vs. Madison, seguido pelo caso Lochner vs. Estado de Nova Iorque, em 1905. Esses precedentes transformaram o modelo de controle constitucional difuso dos Estados Unidos em um dos mais fortes do mundo. Quando Hans Kelsen criou o controle abstrato de constitucionalidade na Àustria de 1920, ele buscou uma alternativa entre o forte modelo americano e a inexistência de um controle de constitucionalidade. Assim, criou um órgão administrativo alheio ao Judiciário, cujas indicações eram feitas pelos demais poderes eleitos, para que seus membros dessem a última palavra sobre a constitucionalidade dos atos normativos do Poder Público.
O modelo brasileiro de controle de constitucionalidade desenhado na Constituição de 1988 é de natureza híbrida, ou seja, copiou em parte o forte modelo madisoniano, bem como o modelo alternativo kelseniano. Ou seja, do ponto de vista normativo, os constituintes permitiram ao STF decidir sobre quaisquer questões, de qualquer natureza. E, como nos disse Lijphart, qualquer pessoa ou entidade que tenha poder tratará de usá-lo de alguma maneira.
Em minha tese de doutorado, intitulada O Silêncio dos Incumbentes:Fragmentação partidária e empoderamento judicial no Brasil, defendida no Programa de Pós-graduação em Ciência Política da Universidade Federal de Pernambuco, deixei bem claro que o ano de 1988 foi um ponto de não retorno. Ou seja, o STF passou a exercer o controle das emendas constitucionais, sendo assim, sobre qualquer tentativa por Proposta de Emenda à Constituição, tendente a lhe diminuir o poder, caberá a ele próprio a decisão final. Além desse ponto em 1988, os anos que se seguiram foram consolidando a nossa Suprema Corte como protagonista do processo decisório. Ginsburg, dentre outros autores, advogam a tese da Suprema Corte como “apólice de seguro”. Ou seja, em um ambiente de fragmentação partidária, que favorece as incertezas políticas, os poderes eleitos tenderiam a dar mais poder ao Tribunal Constitucional. Ao analisar a fragmentação partidária desde 1945 e com a construção de um Indicador de Empoderamento Judicial, utilizei um modelo econométrico (binomial negativo) para testar a hipótese de John Ferejohn de que a fragmentação política traria empoderamento judicial. Delimitando a fragmentação política como fragmentação partidária, a análise dos dados corroborou os argumentos de Ferejohn e de Ginsburg. Nosso STF foi bastante beneficiado no passado pela fragmentação partidária.
Indo além, usei a técnica de Elkins para contar a extensão do Poder Judiciário na Constituição e o Judiciário brasileiro possui a maior extensão quando comparado com os países analisados pelo clássico “Modelos de Democracia”, de Lijphart. Mais: o Brasil é um verdadeiro outlier. Tudo isso, porém, não levou em conta o atual cenário político caótico pelo qual o país passa. Ele corrobora o que já vem sendo dito, em ambientes de incerteza e de fragmentação, o STF passa a ser a voz da razão, com uma ou outra exceção.

Doutor em Ciência Política pela UFPE, advogado, professor da Universidade Federal de Campina Grande-PB, pesquisador do PRAETOR/UFPE e do CEL/UFMG. Voluntário do Movimento Voto Consciente. “Esse blog é feito em parceria com o Movimento Voto Consciente. Todos os autores envolvidos são voluntários da organização e dois textos são publicados por semana. As opiniões não espelham, necessariamente, o que pensa o Movimento Voto Consciente, mas carregam, como valor essencial à democracia, a diversidade expressiva de opiniões de seus analistas - todos estudantes, mestres ou doutores em Ciência Política por renomadas universidades. As temáticas terão sempre como base algum aspecto associado ao Legislativo, e podem retratar realidades e desafios municipais, estaduais e-ou federais."

sexta-feira, 27 de maio de 2016

Arqueologia do Golpe

A arqueologia do Golpe:

Até VEJA admite:

http://www.brasil247.com/pt/247/midiatech/234630/At%C3%A9-Veja-admite-que-Dilma-foi-v%C3%ADtima-de-conspira%C3%A7%C3%A3o.htm

Áudios mostram que partidos financiaram MBL em atos pró-impeachment -

http://noticias.uol.com.br/politica/ultimas-noticias/2016/05/27/maquina-de-partidos-foi-utilizada-em-atos-pro-impeachment-diz-lider-do-mbl.htm

 O PRÓXIMO NA 2. TURMA DO STF RESPONSÁVEL PELA LAVA JATO , SEGUNDO RODÍZIO NATURAL NO TRIBUNAL, SERIA O MIN BANDEIRA DE MELO. MAS, POR ALGUMA RAZÃO OCULTA ELE ABRIU MÃO PARA QUE ASSUMISSE O AMIGO DO PSDB GILMAR MENDES



O golpe visou parar a LAVA JATO

http://www1.folha.uol.com.br/poder/2016/05/1774018-em-dialogos-gravados-juca-fala-em-pacto-para-deter-avanco-da-lava-jato.shtml

Áudio revela atual ministro da Transparência orientando Renan e Machado sobre a Lava Jato:

http://noticias.uol.com.br/politica/ultimas-noticias/2016/05/29/audios-revelam-ministro-da-transparencia-orientando-renan-e-machado-sobre-a-lava-jato.htm



segunda-feira, 23 de maio de 2016

Revelada a moeda de troca do impeachment: Em diálogos gravados, Jucá fala em pacto para deter avanço da Lava Jato

Em conversas ocorridas em março passado, o ministro do Planejamento, senador licenciado Romero Jucá (PMDB-RR), sugeriu ao ex-presidente da Transpetro Sérgio Machado que uma "mudança" no governo federal resultaria em um pacto para "estancar a sangria" representada pela Operação Lava Jato, que investiga ambos.
Gravados de forma oculta, os diálogos entre Machado e Jucá ocorreram semanas antes da votação na Câmara que desencadeou o impeachment da presidente Dilma Rousseff. As conversas somam 1h15min e estão em poder da PGR (Procuradoria-Geral da República).
O advogado do ministro do Planejamento, Antonio Carlos de Almeida Castro, o Kakay, afirmou que seu cliente "jamais pensaria em fazer qualquer interferência" na Lava Jato e que as conversas não contêm ilegalidades.
Machado passou a procurar líderes do PMDB porque temia que as apurações contra ele fossem enviadas de Brasília, onde tramitam no STF (Supremo Tribunal Federal), para a vara do juiz Sergio Moro, em Curitiba (PR).
Em um dos trechos, Machado disse a Jucá: "O Janot está a fim de pegar vocês. E acha que eu sou o caminho. [...] Ele acha que eu sou o caixa de vocês".
Na visão de Machado, o envio do seu caso para Curitiba seria uma estratégia para que ele fizesse uma delação e incriminasse líderes do PMDB.
Machado fez uma ameaça velada e pediu que fosse montada uma "estrutura" para protegê-lo: "Aí fodeu. Aí fodeu para todo mundo. Como montar uma estrutura para evitar que eu 'desça'? Se eu 'descer'...".
Mais adiante, ele voltou a dizer: "Então eu estou preocupado com o quê? Comigo e com vocês. A gente tem que encontrar uma saída".
Machado disse que novas delações na Lava Jato não deixariam "pedra sobre pedra". Jucá concordou que o caso de Machado "não pode ficar na mão desse [Moro]".
O atual ministro afirmou que seria necessária uma resposta política para evitar que o caso caísse nas mãos de Moro. "Se é político, como é a política? Tem que resolver essa porra. Tem que mudar o governo para estancar essa sangria", diz Jucá, um dos articuladores do impeachment de Dilma. Machado respondeu que era necessária "uma coisa política e rápida".
"Eu acho que a gente precisa articular uma ação política", concordou Jucá, que orientou Machado a se reunir com o presidente do Senado, Renan Calheiros (PMDB-AL) e com o ex-presidente José Sarney (PMDB-AP).
Machado quis saber se não poderia ser feita reunião conjunta. "Não pode", disse Jucá, acrescentando que a ideia poderia ser mal interpretada.
Renata Mello/Transpetro
Presidente Sergio Machado em discurso durante cerimônia da viagem inaugural do Navio José Alencar. Foto: Renata Mello / Transpetro ***DIREITOS RESERVADOS. NÃO PUBLICAR SEM AUTORIZAÇÃO DO DETENTOR DOS DIREITOS AUTORAIS E DE IMAGEM***
Sérgio Machado, ex-presidente da Transpetro, durante cerimônia de viagem inaugural de navio
O atual ministro concordou que o envio do processo para o juiz Moro não seria uma boa opção. "Não é um desastre porque não tem nada a ver. Mas é um desgaste, porque você, pô, vai ficar exposto de uma forma sem necessidade."
E chamou Moro de "uma 'Torre de Londres'", em referência ao castelo da Inglaterra em que ocorreram torturas e execuções entre os séculos 15 e 16. Segundo ele, os suspeitos eram enviados para lá "para o cara confessar".
Jucá acrescentou que um eventual governo Michel Temer deveria construir um pacto nacional "com o Supremo, com tudo". Machado disse: "aí parava tudo". "É. Delimitava onde está, pronto", respondeu Jucá, a respeito das investigações.
O senador relatou ainda que havia mantido conversas com "ministros do Supremo", os quais não nominou. Na versão de Jucá ao aliado, eles teriam relacionado a saída de Dilma ao fim das pressões da imprensa e de outros setores pela continuidade das investigações da Lava Jato.
Jucá afirmou que tem "poucos caras ali [no STF]" ao quais não tem acesso e um deles seria o ministro Teori Zavascki, relator da Lava Jato no tribunal, a quem classificou de "um cara fechado".
Machado presidiu a Transpetro, subsidiária da Petrobras, por mais de dez anos (2003-2014), e foi indicado "pelo PMDB nacional", como admitiu em depoimento à Polícia Federal. No STF, é alvo de inquérito ao lado de Renan Calheiros.
Dois delatores relacionaram Machado a um esquema de pagamentos que teria Renan "remotamente, como destinatário" dos valores, segundo a PF. Um dos colaboradores, Paulo Roberto Costa disse que recebeu R$ 500 mil das mãos de Machado.
Jucá é alvo de um inquérito no STF derivado da Lava Jato por suposto recebimento de propina. O dono da UTC, Ricardo Pessoa, afirmou em delação que o peemedebista o procurou para ajudar na campanha de seu filho, candidato a vice-governador de Roraima, e que por isso doou R$ 1,5 milhão.
O valor foi considerado contrapartida à obtenção da obra de Angra 3. Jucá diz que os repasses foram legais.
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LEIA TRECHOS DOS DIÁLOGOS

Data das conversas não foi especificada
SÉRGIO MACHADO - Mas viu, Romero, então eu acho a situação gravíssima.
ROMERO JUCÁ - Eu ontem fui muito claro. [...] Eu só acho o seguinte: com Dilma não dá, com a situação que está. Não adianta esse projeto de mandar o Lula para cá ser ministro, para tocar um gabinete, isso termina por jogar no chão a expectativa da economia. Porque se o Lula entrar, ele vai falar para a CUT, para o MST, é só quem ouve ele mais, quem dá algum crédito, o resto ninguém dá mais credito a ele para porra nenhuma. Concorda comigo? O Lula vai reunir ali com os setores empresariais?
MACHADO - Agora, ele acordou a militância do PT.
JUCÁ - Sim.
MACHADO - Aquele pessoal que resistiu acordou e vai dar merda.
JUCÁ - Eu acho que...
MACHADO - Tem que ter um impeachment.
JUCÁ - Tem que ter impeachment. Não tem saída.
MACHADO - E quem segurar, segura.
JUCÁ - Foi boa a conversa mas vamos ter outras pela frente.
MACHADO - Acontece o seguinte, objetivamente falando, com o negócio que o Supremo fez [autorizou prisões logo após decisões de segunda instância], vai todo mundo delatar.
JUCÁ - Exatamente, e vai sobrar muito. O Marcelo e a Odebrecht vão fazer.
MACHADO - Odebrecht vai fazer.
JUCÁ - Seletiva, mas vai fazer.
MACHADO - Queiroz [Galvão] não sei se vai fazer ou não. A Camargo [Corrêa] vai fazer ou não. Eu estou muito preocupado porque eu acho que... O Janot [procurador-geral da República] está a fim de pegar vocês. E acha que eu sou o caminho.
[...]
JUCÁ - Você tem que ver com seu advogado como é que a gente pode ajudar. [...] Tem que ser política, advogado não encontra [inaudível]. Se é político, como é a política? Tem que resolver essa porra... Tem que mudar o governo pra poder estancar essa sangria.
[...]
MACHADO - Rapaz, a solução mais fácil era botar o Michel [Temer].
JUCÁ - Só o Renan [Calheiros] que está contra essa porra. 'Porque não gosta do Michel, porque o Michel é Eduardo Cunha'. Gente, esquece o Eduardo Cunha, o Eduardo Cunha está morto, porra.
MACHADO - É um acordo, botar o Michel, num grande acordo nacional.
JUCÁ - Com o Supremo, com tudo.
MACHADO - Com tudo, aí parava tudo.
JUCÁ - É. Delimitava onde está, pronto.
[...]
MACHADO - O Renan [Calheiros] é totalmente 'voador'. Ele ainda não compreendeu que a saída dele é o Michel e o Eduardo. Na hora que cassar o Eduardo, que ele tem ódio, o próximo alvo, principal, é ele. Então quanto mais vida, sobrevida, tiver o Eduardo, melhor pra ele. Ele não compreendeu isso não.
JUCÁ - Tem que ser um boi de piranha, pegar um cara, e a gente passar e resolver, chegar do outro lado da margem.
*
MACHADO - A situação é grave. Porque, Romero, eles querem pegar todos os políticos. É que aquele documento que foi dado...
JUCÁ - Acabar com a classe política para ressurgir, construir uma nova casta, pura, que não tem a ver com...
MACHADO - Isso, e pegar todo mundo. E o PSDB, não sei se caiu a ficha já.
JUCÁ - Caiu. Todos eles. Aloysio [Nunes, senador], [o hoje ministro José] Serra, Aécio [Neves, senador].
MACHADO - Caiu a ficha. Tasso [Jereissati] também caiu?
JUCÁ - Também. Todo mundo na bandeja para ser comido.
[...]
MACHADO - O primeiro a ser comido vai ser o Aécio.
JUCÁ - Todos, porra. E vão pegando e vão...
MACHADO - [Sussurrando] O que que a gente fez junto, Romero, naquela eleição, para eleger os deputados, para ele ser presidente da Câmara? [Mudando de assunto] Amigo, eu preciso da sua inteligência.
JUCÁ - Não, veja, eu estou a disposição, você sabe disso. Veja a hora que você quer falar.
MACHADO - Porque se a gente não tiver saída... Porque não tem muito tempo.
JUCÁ - Não, o tempo é emergencial.
MACHADO - É emergencial, então preciso ter uma conversa emergencial com vocês.
JUCÁ - Vá atrás. Eu acho que a gente não pode juntar todo mundo para conversar, viu? [...] Eu acho que você deve procurar o [ex-senador do PMDB José] Sarney, deve falar com o Renan, depois que você falar com os dois, colhe as coisas todas, e aí vamos falar nós dois do que você achou e o que eles ponderaram pra gente conversar.
MACHADO - Acha que não pode ter reunião a três?
JUCÁ - Não pode. Isso de ficar juntando para combinar coisa que não tem nada a ver. Os caras já enxergam outra coisa que não é... Depois a gente conversa os três sem você.
MACHADO - Eu acho o seguinte: se não houver uma solução a curto prazo, o nosso risco é grande.
*
MACHADO - É aquilo que você diz, o Aécio não ganha porra nenhuma...
JUCÁ - Não, esquece. Nenhum político desse tradicional ganha eleição, não.
MACHADO - O Aécio, rapaz... O Aécio não tem condição, a gente sabe disso. Quem que não sabe? Quem não conhece o esquema do Aécio? Eu, que participei de campanha do PSDB...
JUCÁ - É, a gente viveu tudo.
*
JUCÁ - [Em voz baixa] Conversei ontem com alguns ministros do Supremo. Os caras dizem 'ó, só tem condições de [inaudível] sem ela [Dilma]. Enquanto ela estiver ali, a imprensa, os caras querem tirar ela, essa porra não vai parar nunca'. Entendeu? Então... Estou conversando com os generais, comandantes militares. Está tudo tranquilo, os caras dizem que vão garantir. Estão monitorando o MST, não sei o quê, para não perturbar.
MACHADO - Eu acho o seguinte, a saída [para Dilma] é ou licença ou renúncia. A licença é mais suave. O Michel forma um governo de união nacional, faz um grande acordo, protege o Lula, protege todo mundo. Esse país volta à calma, ninguém aguenta mais. Essa cagada desses procuradores de São Paulo ajudou muito. [referência possível ao pedido de prisão de Lula pelo Ministério Público de SP e à condução coercitiva ele para depor no caso da Lava jato]
JUCÁ - Os caras fizeram para poder inviabilizar ele de ir para um ministério. Agora vira obstrução da Justiça, não está deixando o cara, entendeu? Foi um ato violento...
MACHADO -...E burro [...] Tem que ter uma paz, um...
JUCÁ - Eu acho que tem que ter um pacto.
[...]
MACHADO - Um caminho é buscar alguém que tem ligação com o Teori [Zavascki, relator da Lava Jato], mas parece que não tem ninguém.
JUCÁ - Não tem. É um cara fechado, foi ela [Dilma] que botou, um cara... Burocrata da... Ex-ministro do STJ [Superior Tribunal de Justiça]. 

sexta-feira, 20 de maio de 2016

Somente sete dias para destruir as conquistas de anos

Esta semana foi a primeira de governo interino, depois que o rolo compressor parlamentar afastou a presidenta Dilma Rousseff do seu cargo e abriu caminho à ascensão de Michel Temer – que possivelmente já perdeu os 2% de popularidade que tinha há 8 dias atrás.

Nos últimos sete, Temer apresentou um gabinete sem ministros negros, nem ministras mulheres. Seus ministros anunciaram o fim da gratuidade nas universidades públicas, a extinção do Ministério da Cultura, a eliminação da universalidade da saúde pública, a (contra)reforma da previdência, a anulação de contratos para a construção de moradias populares, a revisão da diplomacia preferencial para com a América Latina e os cortes no programa Bolsa Família.

“Este é um governo extremadamente conservador em termos políticos e liberal em termos econômicos”, resumiu Dilma Rousseff. “Desde que chegaram, estão falando em cortar benefícios sociais, como o Bolsa Família, ameaçado de perder entre 10 e 30% (de sua verba). Sabem que significa isso? Significa tirar até 36 milhões de pessoas do programa com uma assinatura”, afirmou Dilma, em diálogo com internautas, em sua nova base de operações políticas, no Palácio da Alvorada. Nessa residência oficial, ela também recebeu legisladores, com os quais analisou a estratégia a ser usada no juízo político que terá que enfrentar na Câmara Alta. Onde será julgada pelos mesmos senadores que aprovaram a abertura do processo, por 55 votos contra 22, um dado que autoriza a pensar que será difícil que a absolvam.

Após visitar a presidenta, o senador Humberto Costa, chefe do bloco do PT, disse ter visto ela “otimista” diante da rápida reação da opinião pública, contra um governo que “comete um erro atrás do outro”, e não satisfaz as expectativas que havia gerado em parte da sociedade.

Se tivesse que escolher a foto da semana inicial de Temer, não estaria nela o presidente interino, e sim a atriz Sônia Braga, em Cannes, junto aos demais membros do elenco do filme Aquarius, que denunciaram o “golpe” com cartazes escritos em inglês e francês. Foi tão potente o impacto dessa notícia que repercutiu até na Globo e em outros meios jornalísticos privados que constituem a muralha que impede a propagação de relatos que mencionam o golpe, apesar dos milhares de cidadãos que vão às ruas para gritar contra ele desde a queda de Dilma Rousseff. Protestos nos quais se observa um bom número de pessoas, muitas delas que não pertencem nem votaram pelo PT, mas que exigem o respeito ao sufrágio popular. Surgiu uma indignação anti conservadora mais vigorosa e que apareceu mais cedo do que se esperava, com o protagonismo dos movimentos sociais e das mulheres, em pé de guerra contra o machismo branco que exala da nomenclatura temerista. A insurgência feminina é particularmente ativa, é um ativismo que foi sendo fermentado nos últimos meses, quando a presidenta deixou seu escritório para encabeçar dezenas de atos em várias cidades. Uma atitude que talvez deveria ter tomado antes, para frear a avalanche antipolítica da classe média, que exigia a sua renúncia.
 
Em certa medida, esta nova rebelião cívica progressista é a que se expressa nas declarações de Sônia Braga (forte candidata à Palma de Ouro em Cannes) e do ator Wagner Moura, protagonista da série Narcos e do filmeTropa de Elite. Ele tampouco é petista, mas já se manifestou, deplorando o “conservadorismo e obscurantismo” do novo regime. Além do cantor Caetano Veloso, que há anos rompeu com o PT, mas que repudiou o impeachment, e que esta semana tocará num edifício ocupado por trabalhadores da cultura no Rio de Janeiro.
 
Se tivesse que escolher uma segunda foto dos primeiros sete dias do governo interino, também não seria de Temer, mas do deputado federal afastado Eduardo Cunha, considerado pelo Ministério Público Federal como o “chefe” de uma organização criminosa que tomou conta da Câmara dos Deputados.
 
Essa fotografia de Cunha certamente será a que tomou nesta quinta-feira, quando ele reapareceu na sede do Poder Legislativo, apesar ter sido suspendido do cargo e de ter perdido seus foros, por decisão do Supremo Tribunal Federal, que o processou por várias acusações, a partir das evidências de que ele era uma peça importante na trama de corrupção que desviou recursos da empresa estatal Petrobras, com a cumplicidade de grandes empresas construtoras e membros do PT.
 
Voltar ao Congresso apesar do seu afastamento provisório foi uma demonstração do poder que Cunha ainda tem, sendo ele um sócio sem o qual Temer não teria chegado onde está. Porque foi ele, o ex-presidente da Câmara dos Deputados, quem desarquivou o processo e escalou ao menos 200 congressistas, entre eles muitos pastores, ex-policiais e processados pela Justiça, para que formassem o pelotão de choque pela aprovação do impeachment contra Dilma, na cômica sessão daquele domingo 17 de abril, quando a oposição esmagou o governo por 367 votos contra 137. O resultado decretou o irremediável fim da mandatária eleita. Semanas depois, ela também seria derrotada no Senado.
 
Apesar de Temer ter evitado se mostrar diante das câmeras junto ao seu correligionário Cunha – o político brasileiro com pior imagem no mundo –, não deixou de escalar dois dos afilhados políticos dele para serem membros do seu gabinete, e nomeou um terceiro como novo chefe da bancada governista na Câmara.
 
Sem o apoio dessa bancada, o chefe de Estado provisório não conseguirá aprovar nenhuma das leis indispensáveis para implementar o programa de ajustes prometido aos banqueiros e investidores estrangeiros, que agora são representados pelo novo ministro da Fazenda, Henrique Meirelles.
 
Ex-executivo do Banco de Boston, Meirelles é o fiador do novo chefe do Banco Central, Ilan Goldfajn, que por sua vez foi chefe de economistas do Banco Itaú.
 
Aliás, Meirelles é o superministro do gabinete de Temer, um presidente com dificuldades para garantir a governabilidade, e que depende muito do poder nas sombras de Eduardo Cunha.
 
Esse é o triunvirato sobre o que o novo regime se apoia, e que tem em sua segunda linha de poder o chanceler José Serra – que em seu discurso de posse anunciou o fim da diplomacia com eixo nas relações Sul-Sul, o fortalecimento dos vínculos com a Argentina e os Estados Unidos, e a revisão do Mercosul para retomar sua dimensão comercial.
 
Tradução: Victor Farinelli

quarta-feira, 18 de maio de 2016

Justiça e direitos do trabalho na mira

Fonte: http://cartamaior.com.br/?/Editoria/Politica/Justica-e-direitos-do-trabalho-na-mira/4/36116

Devido à vitória do projeto rentista ao qual a elite econômica aderiu majoritariamente, os direitos sociais e do trabalho correm perigo.


Rubens Goyatá Campante
Lula Marques
A Justiça do Trabalho completou 75 anos, no último dia 01 de maio, em meio a uma das piores agruras de sua história. O orçamento federal de 2016 cortou verbas do Senado, da Câmara Federal, do TCU, do Judiciário Federal, etc. Mas o corte na Justiça do Trabalho foi o mais profundo: redução de 29% das dotações de custeio e 90% das de investimento -  nos outros ramos do Judiciário Federal (Justiça Federal, Eleitoral, Ministério Público) a redução foi de 15% no custeio e 40% no investimento. 

Os efeitos logo se fizeram sentir. Somente no Tribunal Regional do Trabalho de Minas Gerais foram dispensados centenas de trabalhadores terceirizados, entre motoristas, faxineiros, copeiros e seguranças, além de estagiários e dos deficientes auditivos que prestavam serviços para o TRT/MG por meio de parceria com a FENEIS (Federação Nacional de Educação e Integração dos Surdos). O público também foi atingido: para diminuir a conta de energia elétrica o TRT mineiro encerrará seu expediente às 16 horas, a partir do dia 16 de maio. Isto num momento em que, devido à explosão do desemprego e da crise econômica o número de demandas trabalhistas já cresceu, neste ano, 50% em relação ao ano passado, segundo o presidente do Tribunal Superior do Trabalho Ives Gandra Martins Filho. Se não houver uma reversão,, ao menos parcial, dos cortes, “fecharemos as portas a partir de agosto”, afirma ele.

A quem interessaria a Justiça do Trabalho fechar suas portas? Qual a justificativa para que esta tenha sofrido restrições mais severas? O relatório do Orçamento da União afirma que as regras trabalhistas atuais estimulam a judicialização dos conflitos, na medida em que seriam extremamente condescendentes com o trabalhador, e sublinha a necessidade de diminuir a demanda de litígios trabalhistas, afirmando que o cancelamento das dotações seria uma “forma de estimular uma reflexão sobre a necessidade e urgência de tais mudanças”

Mas as regras trabalhistas, quem as faz é o Legislativo, não o Judiciário Trabalhista, e o aumento de demandas laborais tem causas econômicas e sociais muito mais complexas que uma suposta atuação estatal “protecionista”. Asfixiar financeiramente a Justiça do Trabalho para que ela abandone tal “protecionismo” é uma grosseira e escandalosa chantagem institucional, afirmou a Associação Nacional de Magistrados Trabalhistas  (ANAMATRA), que entrou com uma Ação Direta de Inconstitucionalidade no Supremo Tribunal Federal contra os cortes orçamentários


Essa chantagem institucional não é acidental ou conjuntural. Faz parte de um movimento maior, que põe a Justiça do Trabalho na mira, mas cujo verdadeiro alvo são os direitos sociais e do trabalho. As propostas de expandir ao máximo as possibilidades legais da terceirização e de fazer prevalecer o negociado sobre o legislado são algumas das expressões principais deste alvo. A terceirização é, sabidamente, vetor de precarização do trabalho, e a negociação entre empregador e empregado é importante, mas a partir de um patamar legal mínimo, sem o qual, especialmente em situações de crise econômica e desemprego, a parte mais fraca, os trabalhadores, tende a abrir mão de garantias básicas de dignidade pessoal.

Perigam os direitos sociais e do trabalho devido à vitória do projeto rentista ao qual a elite econômica aderiu majoritariamente, derrotando o projeto desenvolvimentista-produtivista ensaiado pelo primeiro governo de Dilma Rousseff. 

O governo de Luiz Inácio Lula da Silva foi marcado pelas políticas sociais que, indubitavelmente, melhoraram a vida dos brasileiros carentes, mas também pela tendência pragmática à conciliação com várias estruturas de poder construídas ao longo da história brasileira – de fundamental importância, dentre outras, o funcionamento viciado do sistema político-eleitoral e o predomínio do setor financeiro sobre a economia produtiva.

Dilma Rousseff, no início de seu primeiro mandato, teve a audácia de tentar desafiar esta última estrutura, propondo um pacto produtivista e desenvolvimentista que contou, em seu início, com o apoio, ao menos formal, de representações patronais e obreiras. A ideia era estimular a reindustrialização do país, o crescimento da economia, do mercado interno e da geração de empregos através de várias iniciativas: apoio a empresas nacionais por via de empréstimos generosos do BNDES; desonerações fiscais; barateamento da energia elétrica e investimento em infra-estrutura; desvalorização da moeda e proteção ao produto nacional. Tal agenda implicava “domesticar” o rentismo exacerbado, por meio de medidas fundamentais, que diminuiriam os lucros absurdos do sistema financeiro: redução dos juros e do spread bancário e controle de capitais. 

Não deu certo. O empresariado industrial, parte fundamental desse pacto neodesenvolvimentista, abandonou o barco. Porque o fez, já que seria (e foi, durante certo tempo) beneficiado pelo projeto, é pergunta obrigatória, mas não cabe desenvolvê-la aqui. O fato é que, em uma economia oligopolizada, os preços começaram a subir e, como “remédio” para o repique da inflação, os juros também – abalando irremediavelmente um fundamento basilar da empreitada. Isso ocorreu em 2013, mesmo ano em que as gigantescas e amorfas manifestações de protesto, com sua aversão generalizada à política e às instituições, e sua instrumentalização anti-governamental pela grande mídia, ajudaram a minar o apoio à Presidente. 

Duas conseqüências da vitória do pacto rentista/financeiro:  1) o governo Dilma ficou desnorteado. Perdeu seu grande projeto e não tinha um “plano B”. E nem considerou apoiar-se nos trabalhadores, nos movimentos sociais, na militância de seu partido, nos aliados e correligionários do Congresso, na sociedade civil. Desde então, é um governo sem consistência ou coerência. 2) no mesmo momento em que essa vitória se desenhou, em meados de 2013, a pauta da precarização dos direitos trabalhistas foi recolocada. Em 2013, quando da campanha pela aprovação do PL 4330, que escancarava a terceirização, um ministro do Tribunal Superior do Trabalho dizia  não entender o porquê dessa demanda empresarial, já que a economia não estava em crise e que as perspectivas de um desenvolvimento econômico inclusivo eram plausíveis. Não eram. Ao abraçarem a proposta da terceirização, os líderes empresariais já sabiam que,  boicotado o produtivismo, a perspectiva era a do “desenvolvimento” dependente-associado, sob o abrigo da ordem rentista internacional, na qual o setor produtivo e nacional da economia brasileira entram como “sócios menores” no esquema global, e por isso só se viabilizam pela exploração feroz, desenfreada, dos recursos humanos e naturais do país.

Raymond Aron dizia que as opções políticas não se davam entre o Bem ou o Mal absolutos, mas entre o preferível e o detestável. Para 99% dos brasileiros, é preferível a escolha pela economia real, da produção e do comércio, potencialmente inclusiva. E detestável a opção pela economia predatória da especulação financeira. 

Mesmo preferível, o neodesenvolvimentismo tem, contudo, um  problema - comum, aliás, à opção rentista/financeira -, o economicismo. Como  predomínio da esfera econômica  sobre a política, a sociedade e a cultura, o economicismo, conquanto reconheça, eventualmente, a importância da pauta dos direitos sociais e da dignidade humana, condiciona e hipoteca essa pauta inclusiva a uma expansão prévia da disponibilidade de bens e serviços numa sociedade. Distribuir, sim, mas imprescindível, antes, expandir e organizar. 

Mas não seria certo que, antes de distribuir, organize-se o que distribuir ?A questão é que essa distribuição não é só de riqueza, mas de direitos, tem a ver com o fim de barreiras de privilégios, não só materiais, mas simbólicos e culturais. Expandir a economia e a riqueza é fundamental, mas expandir a cidadania é tanto quanto, e uma expansão não pode ser anterior e condicionadora da outra. A Europa Ocidental construiu seus estados de bem estar social quando se encontrava em situação de penúria econômica extrema, no pós-guerra. Cuidou disso ao mesmo tempo em que cuidava de se recuperar economicamente. E o estabelecimento de parâmetros sociais inegociáveis,  abaixo dos quais a dignidade humana e a cidadania são impossíveis, não impede o desenvolvimento econômico mas faz com que ele se paute pela produtividade e capacidade de inovação, e não pela espoliação bruta e tosca do trabalho e da natureza. 

Tem exatamente a ver com isso a Justiça e os direitos do trabalho.  Sua presença e sua eficácia (que não é plena, mas também não é nula, e pode aumentar) estabelecem tais parâmetros mínimos de dignidade humana e cidadania. Parâmetros que não são, absolutamente, contra o capital e a economia, mas uma barreira ao economicismo, o que é diferente. São uma barreira à exploração desumana do trabalho, corolário, particularmente no Brasil, da hegemonia do sistema rentista/financeiro e do neoliberalismo. 

Por isso estão na mira.  





Rubens Goyatá Campante – Doutor em Sociologia Política, membro do CERBRAS (Centro de Estudos Republicanos Brasileiros), do PRUNART/UFMG (Programa Universitário de Apoio às Relações de Trabalho) e pesquisador da Escola Judicial do TRT-3ª Região

segunda-feira, 16 de maio de 2016

O que deu errado? Não culpemos as instituições - Argelina Figueiredo

A pergunta feita a mim pela Folha não foi por acaso. Sempre argumentei que as instituições representativas e de governo brasileiras –ou seja, o presidencialismo, o federalismo, o sistema proporcional de lista aberta e o multipartidarismo– não constituíam obstáculos para o funcionamento e a mudança de políticas públicas em governos de coalizão.
A centralização decisória estabelecida na Constituição de 1988, com o aumento dos poderes legislativos do Executivo, e o fortalecimento dos líderes partidários inscritos no regimento da Câmara dos Deputados podem funcionar como instrumentos de barganha entre o governo e sua base parlamentar, resultando em apoio congressual sistemático e na capacidade do governo de aprovar suas propostas legislativas.
Por isso, sempre fui contra mudanças drásticas das nossas instituições representativas e de governo, pois elas garantem acesso das demandas da população ao centro decisório e mais equilíbrio entre os poderes.
Seus efeitos na representação e na participação dos cidadãos compensam eventuais conflitos que possam gerar na formulação de políticas públicas.
Se os constituintes decidiram maior centralização decisória para garantir mais eficácia e legitimidade ao governo democrático, não é preciso colocar uma camisa de força na representação, fomentar artificialmente o majoritarismo, promover a fusão dos poderes Legislativo e Executivo e muito menos negar representação nos governos subnacionais.
Os 20 anos de estabilidade econômica e política me parecem suficientes para demonstrar que essa combinação institucional não é inviável.
Durante esse período testemunhamos significativas mudanças na organização do Estado e da economia, na política e nas políticas públicas e, principalmente, na incorporação econômica e social das camadas mais baixas da população, além de comprovada melhoria de suas condições de vida.
Tudo isso foi conquistado com extensa e crescente participação social e eleitoral, ao contrário do que ocorre nas chamadas democracias consolidadas, ou mais antigas, como prefiro.
O Brasil que retornou plenamente à democracia em 1988 é muito melhor do que o país entregue pelos militares. E, apesar do longo caminho ainda a percorrer, certamente é mais justo.
O que deu errado, então? Nada a ver com as instituições, pelo menos não com as instituições em geral responsabilizadas pelas mazelas do sistema político brasileiro.
O que temos hoje é um cabo de guerra entre um governo fragilizado pelo baixo desempenho da economia e pelas denúncias de seu envolvimento em práticas corruptas e uma oposição desleal, ou seja, aquela que, segundo os manuais de ciência política, não aceita as regras do jogo. Vejamos.
A origem da crise está na vitória do PT nas eleições de 2014. O país enfrentava sérios problemas econômicos que ameaçavam os ganhos obtidos pela população por mais de uma década. A baixa popularidade do governo expressava o descontentamento com a situação. Além disso, denúncias de um esquema de corrupção na Petrobrás, liderado pelo partido do governo, alimentavam as manchetes jornalísticas diariamente.
Ao final do processo, o PSDB, principal partido de oposição, não aceitou sua quarta derrota na disputa presidencial. Solicitou a recontagem dos votos, demanda negada pela Justiça Eleitoral, fiadora até então inconteste da lisura das eleições brasileiras.
Nascia aí o objetivo que mais tarde se tornaria claro, o objetivo de não permitir que a presidenta concluísse seu mandato, custasse o que custasse.
A coalizão oposicionista se ampliou e ganhou as redes sociais e as ruas. A primeira grande manifestação contra o governo foi em março de 2015 e outras se seguiram durante o ano, além dos panelaços a qualquer ação pública da presidenta.
O apoio mais conspícuo entre as "classes produtoras" veio da Fiesp, Federação das Indústrias do Estado de São Paulo, mas ela não foi exceção. A imprensa oligopolista foi conivente com vazamentos de delações em momentos estratégicos e não negou manchetes, além de reportagens enviesadas e análises favoráveis à oposição.
No front legislativo, o segundo mandato inicia com a disputa entre o PT e o PMDB pela presidência da Câmara e a vitória do candidato do PMDB, Eduardo Cunha, azedando ainda mais as relações do governo com seu maior aliado e com sua base parlamentar.
Denunciado pela Justiça, o presidente da Câmara faz um verdadeiro leilão de seu apoio ao governo ou à oposição em troca de proteção, até romper definitivamente com o governo.
Usando de todas as prerrogativas do cargo, todas as ações de Eduardo Cunha tiveram um único objetivo: tornar críveis suas ameaças visando proteção.
Com a denúncia contra ele aceita pelo Supremo Tribunal Federal e um processo de cassação no Conselho de Ética da Câmara, Cunha acolhe, em dezembro de 2015, um dos muitos processos que pediam o impeachment da presidente.
Em 2016, manifestações de apoio ao governo se contrapõem às da oposição. Fica cada vez mais claro o antagonismo entre projetos políticos dos dois grupos liderados pelo PT e o PSDB, o que aliás já era evidente nas eleições.
O PT deu de bandeja as bandeiras que a oposição abraçou. Medidas tomadas pelo governo no primeiro mandato de Dilma e os as práticas adotadas pelo partido para se manter no poder criaram um adversário mais fácil de ser abatido.
E a oposição ainda contou com o apoio de setores econômicos e sociais mais poderosos. A origem da crise, portanto, não está nas instituições, mas na correlação de forças entre diferentes grupos políticos.
Temos que parar com a mania de culpar as instituições básicas da República –presidencialismo, multipartidarismo, federalismo– por crises que têm raízes sociais, econômicas e políticas. Isso é diversionismo.
ARGELINA CHEIBUB FIGUEIREDO é professora do Instituto de Estudos Sociais e Políticos da Uerj e autora de "Democracia ou Reformas? Alternativas Democráticas à Crise Política - 1961-1964" (Editora Paz e Terra) e coautora de "Executivo e Legislativo na Nova Ordem Democrática" (Editora FGV)

segunda-feira, 9 de maio de 2016

Clássicos do pensamento político: Hobbes, Locke, Rousseau em pdf para baixar

Link para textos considerados clássicos do pensamento político: Hobbes, Locke, Rousseau na visão de comentaristas em duas obras didáticas. A primeira organizada por Francisco Weffort e a segunda pelo Prof. Wolkmer. Ótima leitura:

WEFFORT: Clássicos Politica Hobbes Locke Rousseau

WOLKMER: Historia pensamento politico Hobbes Locke Rousseau