domingo, 29 de julho de 2012

A relação dos jovens e a política - Entrevista O Correio do Povo


Em Jaraguá do Sul, 106.020 mil eleitores estão aptos para comparecer às urnas nas próximas eleições municipais de outubro. Do total, apenas 1,43% (1.515) são jovens entre 16 e 17 anos, que votarão pela primeira vez mesmo sem a obrigação legal de participar. Na opinião do mestre em Sociologia Política, Jeison Giovani Heiler, o baixo interesse entre os jovens nos assuntos públicos é um reflexo da apatia política vivida por toda a sociedade, não sendo característica exclusiva dessa faixa etária. Nessa entrevista ao portal do jornal O Correio do Povo o especialista comenta sobre a relação entre os jovens e a política.

 O Correio do Povo - Por que a maioria dos jovens não tem tanto interesse em política? Ou isso acontece não apenas com os jovens, mas com toda a população?
Jeison Giovani Heiler - A apatia política, ou ausência de participação da população é um fenômeno que tem chamado a atenção de especialistas há algum tempo. Entre os especialistas, o índice de participação em determinadas sociedades recebe o nome de capital social. Assim, tanto maior será o capital social quanto mais politizada, mais tempo livre, trabalho voluntário, participação em grupos, organizações, lazer, entre outros, tiver uma população. Há estudos recentes identificando níveis altos de capital social com bem estar e felicidade da população. Contudo, entre os diversos problemas, o fato é que em um regime de trabalho de 44 horas semanais é realmente muito difícil pensar em níveis de participação coletiva que não sejam meramente pontuais.
 Normalmente se atribui a ausência de participação na virtual separação construída entre a vida pública e a vida privada. A vida privada é recheada de estímulos, o homem moderno é convidado a viver toda a potencialidade de sua existência no apertado limite de sua vida privada, normalmente traduzida em atividades de consumo. Não por acaso os shoppings centers estão lotados e os espaços públicos esvaziados. Por outro lado a vida pública é desconstruída. Nenhuma virtude é evidenciada na atividade pública, que além de carecer de atrativos que possam competir com a vida privada individualista, ainda recebe os golpes trazidos com escândalos e envolvimento de figuras públicas com episódios de corrupção.
 Mas, além disso, o próprio modelo de democracia representativa, na essência, não foi construído para apresentar altas taxas de participação. Quando a democracia, tal como a conhecemos foi idealizada, partiu-se da concepção de um método de alternância de determinados grupos no poder, por intermédio da captação do voto, apenas isso. Na verdade, na sua formulação, a democracia representativa buscava relegar a participação política ao mínimo tolerável. Esse desenho institucional era necessário para não inchar o Estado com excessivas reivindicações populares. Atualmente a manifestação desse ideário é sentida no sucateamento da educação por exemplo.
 Ou seja, pode-se dizer que, infelizmente, a apatia política não é característica exclusiva da juventude brasileira. O que ocorre é que se há uma ausência de interesse de participação na coisa pública, naturalmente a população dessa faixa etária reflete esse comportamento.
 OCP - Acha que a imagem que existe do político hoje - como sendo sempre corrupto, ladrão - desestimula a participação dos jovens? A política estaria desacreditada? Existe uma sensação de “impotência”?
 JGH - A imagem negativa que se construiu do “político” como categoria sociológica, ao longo do tempo, reflete a desconstrução da vida pública como algo desejável. A política, como manifestação da vida pública, efetivamente está desacreditada, a imagem de corrupto, ladrão, interesseiro, colou, e a figura do político está entre as menos desejáveis quando se compara com outras profissões, por exemplo. Este sentimento evidentemente funciona como desestímulo para a participação política.
OCP - Que recomendações você daria a um jovem que vai fazer seu título eleitoral e votar pela primeira vez? (Seja por vontade própria, aos 16 ou 17, ou depois aos 18).
 JGH - Ao jovem, diante desse cenário desencantador que a vida pública parece oferecer, o recado a ser dado é de que a participação política nas urnas a partir dos 16 anos foi conquista ao custo de muito suor, sangue, vidas perdidas e só foi possível depois do processo de reabertura democrática, ocorrido sob a voz de milhares de jovens que gritavam pelas diretas já, e que culminou com a Constituição de 1988. Além disso, a participação política, principalmente da juventude, não pode de forma alguma resumir-se ao voto. É necessário ocupar os espaços públicos, é necessário recolonizar a vida pública.
 Em termos mais simples, o jovem pode até não gostar de política, mas é preciso que saiba que figuras como Demóstenes Torres, Maluf, Collor e outras velhas raposas políticas gostam. E que se o espaço público não for ocupado pelas pessoas honestas, certamente deixará figuras como essas velhas raposas à vontade para fazer o velho jogo sujo.
 OCP - Quanto mais cedo os jovens se interessarem em participar das eleições melhor? Ou não? Por quê?
 JGH - Claro que sim. A juventude é a força nova que tem todos os horizontes escancarados. O novo político só pode ser moldado a partir da participação política da juventude. Os jovens desse país trazem sobre os ombros a responsabilidade de construir uma nova cultura política. De nada adianta reclamar da corrupção se não houver envolvimento político para dar à política a função que sempre possuiu: de regular e organizar o exercício do poder com vistas à melhoria da vida em sociedade. Se todos concordam que a política está comprometida até a raiz com o problema da corrupção, devem concordar que este não é um problema que vai se resolver espontaneamente. É preciso agir politicamente, e agir politicamente é participar da vida pública. Quando mais tarde isso começar a ocorrer mais difícil vai ser para reverter-se o atual estado de coisas.
 Em outros termos, a corrupção é alimentada, sobretudo pela renúncia à cidadania que assinamos a cada vez que abrimos mão de participar de uma simples reunião de bairro ou pelo desinteresse pelas matérias políticas veiculadas pela imprensa. Em uma palavra: é alimentada pela apatia política. O que é paradoxal nesse estado de coisas é que o afastamento dos cidadãos das questões políticas se dá, em grande parte, justamente em decorrência do mau uso do poder, que descamba em episódios de corrupção que se tornam a cada dia mais corriqueiros. Assim, ao invés de lutarmos pela reocupação destes espaços vazios na política, lançamo-nos à vida privada, em busca de uma felicidade individual geralmente identificada com ter dinheiro. Alimentamos assim o monstro que nos devorará a todos. Este monstro alimenta-se da renúncia à vida pública que criamos com nossa apatia política.
Verônica Lemus
Repórter - veronica@ocorreiodopovo.com.br

3 comentários:

  1. Bela entrevista Professor, realmente penso que não só os adolescentes, mas todos os cidadãos estão desmotivados a votar por causa desse ciclo de corrupção da política Brasileira.

    ResponderExcluir
  2. Legal professor, gostei das considerações, principalmente da análise do fato de nossa jornada de trabalho e do nosso dia a dia não deixar tempo para reflexões. Só que sempre no final a responsabilidade cai sobre a população, parece que sempre foi e sempre vai ser assim, será que não está na hora de pensar diferente? Quem sabe nos livrarmos deste modelo de Estado gigante, presente em tudo, e partirmos para um Estado que deixa as pessoas em paz, que a influência do Estado na vida do cidadão seja mínima e com isso adequar... participação mínima com influência mínima! o que acha?

    ResponderExcluir
  3. Muito boa a entrevista, é bastante esclarecedor o seu ponto de vista, e acreditamos que o ponto mais forte para mudar uma sociedade é a participação, quando o professor fala "De nada adianta reclamar da corrupção se não houver envolvimento político para dar à política a função que sempre possuiu: de regular e organizar o exercício do poder com vistas à melhoria da vida em sociedade." acreditamos que é o marco de passagem que a mudança não é só política mas é cultural, no sentido que se mudarmos nosso pensamento hoje, em sala de aula e passando esse pensamento para fora, vamos ter pessoas mais honestas e consequentemente menos corrupção, pois vamos escolher melhor, ser mais críticos e buscar um bem da sociedade em geral. Ficar reclamando sentado é inútil, a participação política, crítica e consciente, significa um bem geral da nação. E como nós jovens somos o "futuro" é por nós mesmos que essa realidade deve melhorar.

    ResponderExcluir