quarta-feira, 27 de novembro de 2013

Amar é coisa de minutos

Amar você é coisa de minutos
A morte é menos que teu beijo
Tão bom ser teu que sou
Eu a teus pés derramado
Pouco resta do que fui
De ti depende ser bom ou ruim
Serei o que achares conveniente
Serei para ti mais que um cão
Uma sombra que te aquece
Um deus que não esquece
Um servo que não diz não
Morto teu pai serei teu irmão
Direi os versos que quiseres
Esquecerei todas as mulheres
Serei tanto e tudo e todos
Vais ter nojo de eu ser isso
E estarei a teu serviço
Enquanto durar meu corpo
Enquanto me correr nas veias
O rio vermelho que se inflama
Ao ver teu rosto feito tocha
Serei teu rei teu pão tua coisa tua rocha
Sim, eu estarei aqui

Paulo Leminski

segunda-feira, 18 de novembro de 2013

Veja como o STJ tem tratado de casos de paciente com câncer

Veja como o STJ tem tratado de casos de paciente com câncer

 
Apesar de ser uma doença cada vez mais recorrente e seu tratamento evoluir a cada dia, a notícia do diagnóstico de câncer choca e amedronta. E o universo de pessoas que enfrentam essa luta tende a crescer. Artigo publicado em abril passado na revista médica The Lancetrevelou que o Brasil terá um aumento de 38% no número de casos de câncer durante esta década. Em 2020, deverão ser mais de 500 mil novos casos por ano no país.

O exercício de direitos previstos em lei e reconhecidos pela jurisprudência pode ser um estímulo ao paciente na busca por mais qualidade de vida e enquanto os sintomas perdurarem. Diversas normas brasileiras preveem tratamento diferenciado ao doente de câncer, como isenção de tributos, aposentadoria antecipada e acesso a recursos financeiros especiais.

A prioridade na tramitação de processos de interesse de pessoas com doenças graves, como o câncer, em todas as instâncias, está prevista no Código de Processo Civil (CPC). No Superior Tribunal de Justiça (STJ), a jurisprudência traz relatos de diversas teses que dizem respeito aos pacientes oncológicos.

Isenção do IRPF

Ao lado do direito à aposentadoria por invalidez, o benefício da isenção de pagamento de Imposto de Renda sobre aposentadoria está entre os mais conhecidos pelos doentes de câncer. O dado é da pesquisa O conhecimento dos pacientes com câncer sobre seus direitos legais, realizada pela Escola de Enfermagem da Universidade de São Paulo (USP) e publicada em 2011. A mesma pesquisa ainda dava conta de que 45% dos pacientes desconheciam qualquer direito.

O STJ já tem jurisprudência firmada em recurso repetitivo no sentido de que o paciente oncológico faz jus à isenção do imposto sobre seus proventos (REsp 1.116.620). A doença está listada no artigo 6º, XIV, da Lei 7.713/1988.

Recentemente, no julgamento do AREsp 198.795, a 2ª Turma definiu que o juiz é livre para apreciar as provas dos autos e não está adstrito ao laudo oficial para formação do seu convencimento sobre a ocorrência de câncer, na hipótese de pedido de isenção de IR. No caso, a Fazenda Nacional recorreu de decisão da segunda instância que concedeu o benefício.

A paciente havia se submetido à retirada de mama em razão de câncer. Para o STJ, sendo incontroversa a ocorrência da neoplasia maligna, é reconhecido o direito à isenção independentemente do estágio da doença, ou mesmo da ausência de sintomas.

A 1ª Turma tem o mesmo entendimento. Em 2008, ao julgar o REsp 1.088.379, o ministro Francisco Falcão ressaltou que, ainda que se alegue que a lesão foi retirada e que o paciente não apresenta sinais de persistência ou recidiva da doença, o entendimento no STJ é de que a isenção do IR em favor dos inativos portadores de moléstia grave tem como objetivo diminuir o sacrifício do aposentado, aliviando os encargos financeiros relativos ao acompanhamento médico e medicações ministradas.

Outro ponto debatido na Corte diz respeito ao prazo para requerer a devolução do imposto descontado indevidamente. Ao julgar o REsp 1.215.188, a 2ª Turma reconheceu a natureza tributária do debate e aplicou o artigo 168 do Código Tributário Nacional (CTN), segundo o qual o direito de pleitear a restituição extingue-se em cinco anos.

Proventos integrais

Se o paciente de câncer for considerado permanentemente incapaz para trabalhar, tem direito a aposentadoria antecipada. A exceção é para o caso de quando a doença já existir quando o trabalhador ingressar na Previdência Social. É a perícia do órgão que constata essa incapacidade. Se o aposentado por invalidez ainda necessitar de assistência permanente de outra pessoa, a depender da perícia médica, o valor do benefício será aumentado em 25% a partir da data do pedido, ainda que o valor ultrapasse o limite máximo previsto em lei.
Em setembro passado, a 1ª Seção concedeu aposentadoria por invalidez com proventos integrais a um servidor público acometido por câncer (melanoma). O servidor já havia obtido o benefício da isenção de IR. O relator, ministro Herman Benjamin, observou que tanto a aposentadoria integral como a isenção do Imposto de Renda decorrem de um mesmo fato comum (doença grave) e são benefícios inspirados por razões de natureza humanitária (MS 17.464).

Assim, afirmou o ministro, não há incompatibilidade na concessão simultânea de ambos os benefícios, especialmente se considerado que a própria lei estabeleceu que a isenção recai, precisamente, sobre os proventos de aposentadoria – a lei não previu isenção sobre os vencimentos de trabalhador ativo.

Levantamento do FGTS

Lei Complementar 110/2001 admite o saque do Fundo de Garantia do Tempo de Serviço (FGTS), em única parcela, aos pacientes com câncer, independentemente do tipo e da gravidade. O mesmo vale para o saque do PIS/Pasep. Em 2002, o direito aplicado à neoplasia maligna foi, inclusive, estendido pelo STJ a pacientes com Aids, no julgamento do REsp 387.846.

Naquele julgamento, o relator, ministro Humberto Gomes de Barros, reafirmou que, sendo o doente de câncer ou Aids dependente, os pais trabalhadores podem sacar o FGTS (artigo 20, XI, da Lei 8.036/90 http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/L8036compilada.htm). O pedido deve ser feito em uma agência da Caixa Econômica.

Seguro prestamista

O chamado seguro prestamista serve para o pagamento de saldo devedor de financiamentos adquiridos pelo segurado, em caso de morte ou invalidez. O STJ decidiu que a seguradora não pode se eximir do dever de pagamento da cobertura securitária, sob a alegação de omissão de informações por parte do segurado, se dele não exigiu exames médicos prévios à contratação do seguro. A tese está exposta no acórdão do REsp 1.230.233, analisado em 2011.

No caso, a seguradora foi obrigada a quitar o contrato de financiamento habitacional contratado por uma paciente com câncer de mama. Posteriormente, ela morreu por outra causa atestada em laudo, mas a Caixa Consórcios alegou que haveria a neoplasia preexistente e recorreu até ao STJ para tentar ser eximida do pagamento do seguro à filha da contratante.

Doença preexistente

Já em outro caso julgado este ano pela Terceira Turma (REsp 1.289.628), o STJ rejeitou recurso apresentado pela viúva e filhas de um segurado, falecido vítima de liposarcoma. Elas pleiteavam o pagamento de R$ 300 mil referentes ao seguro de vida.


O Tribunal de Justiça de São Paulo, diante das provas do processo, reconheceu que, ao preencher o questionário sobre suas condições de saúde, o segurado deixou de prestar declarações verdadeiras e completas quanto à existência de doença grave por ele conhecida. Nessa hipótese, ficou caracterizada a má-fé, que afasta o direito da indenização securitária.
No STJ, o ministro Villas Bôas Cueva esclareceu que, segundo a jurisprudência do Tribunal, a seguradora pode alegar tratar-se de doença preexistente apenas se houver prévio exame médico, o que não ocorreu na hipótese, ou prova inequívoca da má-fé do segurado. Essa última situação foi constatada pelas instâncias anteriores, e o STJ não pode rever provas quando analisa um recurso especial (Súmula 7).

Para o ministro, uma vez reconhecida a má-fé do segurado na contratação do seguro, não há motivo para cogitar o pagamento da indenização. Embora o segurado tenha afirmado naquele momento que não ostentava nenhuma das doenças elencadas no questionário, as instâncias ordinárias entenderam que ele já tinha ciência de que era portador de um tipo de câncer com alto índice de recidiva.

Cobertura

Ao julgar o REsp 519.940, a Terceira Turma determinou que o plano de saúde cobrisse as despesas com a colocação de prótese para corrigir a incontinência urinária em um homem que havia retirado a próstata em razão de câncer.

Na ocasião, os ministros concordaram que, se a necessidade da prótese decorre de cirurgia coberta pelo plano, a seguradora não pode se valer de cláusula que proíbe a cobertura.

Dano moral presumido

O STJ garantiu o pagamento de indenização por dano moral a um segurado que teve recusado o custeio de tratamento de câncer pelo plano de saúde (REsp 1.322.914). A Terceira Turma atendeu ao recurso do segurado, aplicando a teoria do dano moral presumido (in re ipsa), que dispensa a demonstração de ocorrência do dano. O julgamento reverteu decisão de segunda instância e restabeleceu o valor de R$ 12 mil fixado na sentença para a indenização.

A relatora, ministra Nancy Andrighi, entendeu que “sempre haverá a possibilidade de consequências danosas para o segurado, pois este, após a contratação, costuma procurar o serviço já em evidente situação desfavorável de saúde, tanto física como psicológica”.

Para a ministra, é possível constatar consequências de cunho psicológico, sendo dispensável, assim, a produção de provas de ocorrência de danos morais. Para a Terceira Turma, a injusta recusa de cobertura de seguro de saúde agrava a situação de aflição psicológica do segurado, visto que, ao solicitar autorização da seguradora, ele já se encontrava em condição de abalo psicológico e saúde debilitada.

Reconstrução da mama

A discussão sobre o caráter da cirurgia de reconstrução de mama retirada em razão de câncer – se estética ou reparadora – é recorrente nos tribunais. Para o STJ, é abusiva a cláusula que exclui da cobertura a colocação de próteses em ato cirúrgico coberto pelo plano de saúde, conforme definido nos incisos I e VII do artigo 10 da Lei 9.656/1998, ofendendo o inciso IV do artigo 51 do Código de Defesa do Consumidor, salvo se empregadas para fins estéticos ou não ligadas ao ato cirúrgico.

Ao julgar o REsp 1.190.880, a ministra Nancy Andrighi condenou a Bradesco Saúde a pagar R$ 15 mil como indenização por dano moral a uma segurada. Ela teve de se submeter à retirada de mama, mas ante a recusa do plano, viu-se obrigada a dar cheque sem fundos ao hospital. Posteriormente, conseguiu na Justiça a compensação pelo valor despendido no procedimento (R$ 32 mil), mas somente o STJ veio a reconhecer a ocorrência do dano moral.

“À carga emocional que antecede uma operação somou-se a angústia decorrente não apenas da incerteza quanto à própria realização da cirurgia, mas também acerca dos seus desdobramentos, em especial a alta hospitalar, sua recuperação e a continuidade do tratamento, tudo em virtude de uma negativa de cobertura que, ao final, se demonstrou injustificada, ilegal e abusiva”, refletiu a relatora.

Fornecimento de medicamentos

Em diversos julgamentos, o STJ ratificou entendimento de outras instâncias de que é solidária a responsabilidade dos entes federativos em relação ao dever de fornecer medicamentos aos usuários do SUS. “A responsabilidade em matéria de saúde, aqui traduzida pela distribuição gratuita de medicamentos em favor de pessoas carentes, é dever do estado, no qual são compreendidos todos os entes federativos”, afirmou a ministra Eliana Calmon no julgamento do AREsp 306.524.

O caso tratava de fornecimento gratuito de suplemento nutricional denominado prosure e isossoure a um grupo de portadores de câncer, por no mínimo seis meses, uma vez que se encontravam inválidos e em tratamento domiciliar. A condenação recaiu sobre o Ministério da Saúde e a Secretaria de Saúde do Ceará, e ambos recorreram ao STJ, sem sucesso.

O STJ também tem diversos precedentes que consideram abusiva a cláusula contratual que exclui da cobertura do plano de saúde o fornecimento de medicamento para quimioterapia, tão somente pelo fato de ser ministrado em ambiente domiciliar.

Ao julgar o REsp 183.719, o ministro Luis Felipe Salomão destacou que a exclusão de cobertura de determinado procedimento médico/hospitalar, quando essencial para garantir a saúde e, em algumas vezes, a vida do segurado, vulnera a finalidade básica do contrato.

Em outra decisão (AREsp 292.259), o ministro Raul Araújo salientou que a seguradora não pode alegar desequilíbrio do contrato se há previsão para cobertura da doença. “Não importa se o medicamente deve ser aplicado na residência do paciente ou no hospital, o fato é que ele é destinado ao tratamento da doença, tendo assim cobertura”, afirmou o ministro.

Posse em concurso

No julgamento do AREsp 76.328, em 2011, o ministro Cesar Asfor Rocha (hoje aposentado) entendeu ser impossível rever fatos e provas a ponto de alterar decisão de segunda instância que garantiu a posse de uma candidata em concurso público. Acometida por câncer de mama, ela já havia concluído o tratamento quando foi nomeada. Apresentou atestado, relatório e perícia médica do INSS para demostrar a aptidão para o trabalho, mas o órgão tornou sem efeito a nomeação.

O Tribunal de Justiça de Minas Gerais considerou abusiva a exigência do transcurso de cinco anos de sua cirurgia de retirada do tumor, como condição para posse. Para o tribunal, trata-se de fator de risco de recidiva, fator incerto e futuro, que não pode ser empecilho para a posse.

Em outro caso (AREsp 185.597), a Universidade Federal do Rio Grande do Sul não teve admitido recurso em que contestava a posse – garantida pelas instâncias anteriores – de uma candidata em concurso público. Ela foi considerada inapta no exame físico, em razão do diagnóstico de câncer de mama. Obteve, depois, na Justiça, o direito de assumir o cargo, com recebimento de parcelas atrasadas. O ministro Humberto Martins destacou que o entendimento manifestado até então no processo estava de acordo com a jurisprudência do STJ, o que impediu a admissão do recurso.

Situação semelhante foi apreciada no REsp 1.042.297. A Universidade Federal de Alagoas alegava que “a pessoa portadora de neoplasia maligna necessitaria de tratamento contínuo e eficiente a fim de evitar a recidiva da doença e garantir sua sobrevivência, não podendo, portanto, desenvolver com regularidade a sua função". A candidata havia se submetido à retirada de uma mama em razão de câncer.

O ministro Arnaldo Esteves Lima disse que rever a decisão de segunda instância, favorável à candidata, exigiria análise de provas, o que não é possível no STJ. Além disso, a divergência com casos anteriormente julgados pelo Tribunal Superior não foi demonstrada pela universidade.

Vaga em universidade

Ao julgar o REsp 1.251.347, a 2ª Turma assegurou a uma estudante acometida por câncer a transferência para outra universidade, a fim de dar seguimento ao tratamento da doença (linfoma de Hodgkin). Ela cursava Comunicação Social na Universidade Federal de Santa Maria (UFSM) e ingressou com mandado de segurança para ter garantida uma vaga na Universidade Federal de Santa Catarina, pela necessidade de estar junto aos familiares e de ter a doença sob controle.

A decisão favorável à estudante considerou necessária a observância de seus direitos fundamentais, como a saúde e a educação. Como foram tratados temas constitucionais, o ministro Herman Benjamin entendeu ser impossível rever a questão no STJ, que trata de matéria infraconstitucional. Em outro ponto, em que se alegava que a transferência constituiria burla ao vestibular, o ministro rejeitou o argumento considerando que a estudante foi aprovada no concurso para ingresso na UFSM.

Prisão domiciliar

Quando a matéria é penal, o paciente oncológico também pode receber tratamento diferenciado da Justiça. Há jurisprudência no STJ que reconhece o direito à prisão domiciliar para aquele que está acometido por doença grave, como o câncer, a ponto de não resistir ao cárcere. Foi o entendimento aplicado pela Sexta Turma ao julgar o HC 278.910. No caso, fez-se uma “substituição da prisão preventiva, calcada em motivos de ordem humanitária”.

O preso de 63 anos, sofrendo de câncer de próstata, havia sido internado, sob custódia, por 44 dias. A situação, para os ministros, preencheu a exigência legal para a concessão da prisão domiciliar, isto é, estar “extremamente debilitado por doença grave”. A Turma levou em conta a previsão da neoplasia maligna como doença grave contida na Lei 7.713, que trata da isenção de Imposto de Renda.

Em outro caso (RHC 22.537), julgado em 2008, a Turma também determinou a prisão domiciliar, mas ressalvou que o benefício deveria perdurar apenas enquanto a saúde do agente assim o exigisse, cabendo ao juízo de primeiro grau a fiscalização periódica dessa circunstância. Com informações da Assessoria de Imprensa do STJ.

quarta-feira, 13 de novembro de 2013

Presença do movimento sindical na política brasileira


Jornal ANotícia - 13 de novembro de 20130
Este ensaio objetiva fazer uma breve análise do movimento sindical brasileiro. É presente no campo jornalístico e até mesmo entre sindicalistas e teóricos a visão de que o movimento sindical encontra-se em fase de declínio. Contudo, os analistas mais atentos dão notícia do vigor do sindicalismo brasileiro, principalmente a partir de 2004. José Dari Krein argumenta que a tese hegemônica existente nos anos 1990, de flexibilização das relações de trabalho, foi perdendo força com a melhora dos indicadores do mercado de trabalho, especialmente após 2004. Outros dois conhecidos estudiosos do movimento sindical, Boito Jr e Marcelino, rechaçam abertamente a ideia de declínio do movimento sindical. Para eles, pelo menos desde 2004, é presente uma conjuntura de recuperação da atividade sindical no Brasil.
Os dados mais recentes do Dieese (2012) também confirmam a tendência de recuperação da vitalidade do sindicalismo. Em 2012, o SAG-Dieese registrou 873 greves. As informações da série histórica também revelam que o total de greves cadastrado em 2012 é o maior verificado desde 1997. Analistas costumam advertir que as greves não podem ser tomadas como indicador isolado do grau de vitalidade do movimento sindical. Nesse sentido, os dados do Dieese para 2012 demonstram que, além da manutenção da tendência ao aumento do movimento grevista, foram noticiadas ações de grevistas em 58% dos casos. As ações dos grevistas abrangeram assembleias e atos públicos (486 casos), passeatas (107 casos), piquetes (46 casos). Houve ainda a realização de acampamentos em 28 greves; de ocupações em 25; e de vigílias, em 11 casos.
Longe de caminhar para o seu declínio, parece que o movimento sindical, a despeito do processo de exclusão e criminalização ideológica perpetrada pela onda neoliberalizante, mostra um vigor comparável àquele do seu florescimento na década de 1980 no Brasil.
JEISON GIOVANI HEILER | MESTRE EM SOCIOLOGIA POLÍTICA E DOUTORANDO EM CIÊNCIA POLÍTICA
Versão completa:
Presença do movimento sindical na política brasileira

            Este ensaio objetiva fazer uma breve análise do movimento sindical brasileiro a partir de três abordagens distintas: o trabalho de Boito Jr. e Marcelino (2010) que discute a crise no movimento sindical nos anos 90, um segundo trabalho abordando transformações nas configurações estruturais nas centrais sindicais (GALVÃO, 2012), e um terceiro trabalho abordando o movimento de flexibilização das relações de trabalho (KREIN, et al, 2012). Analisaremos também os últimos dados divulgados pelo DIEESE[1] sobre o panorama das greves no Brasil. No primeiro passo indicaremos brevemente o debate contido em cada um dos trabalhos para em seguida procurar indicar o diagnóstico comum às abordagens, concluindo com questionamentos que podem surgir desse debate.

            O artigo de Amando Boito Jr. e Paula Marcelino (2010) discute a vitalidade do movimento sindical brasileiro. Amplamente amparados em dados sobre as Greves do DIEESE sustentam a tese de que a) o sindicalismo não está em fase de declínio, concepção erroneamente sustentada por alguns pesquisadores,  b) apontam o período da década de 90 como período de crise sindical no Brasil e c) que a partir dos anos 2000 o movimento sindical apresenta uma fase ascendente de recuperação, presente nas manifestações grevistas de cunho ofensivo com efetivo ganho salarial para as classes trabalhadoras, não afetado nem mesmo pela crise de 2008 na economia internacional.

            Andréia Galvão (2012) aborda a reconfiguração do movimento sindical nos governos Lula concluindo que houve um aprofundamento da divisão organizativa que pode ter dois significados opostos: de um lado, pode ser um indicativo de vitalidade, "pois foi a forma encontrada por uma parcela do movimento sindical para manifestar sua  insatisfação  e  seu  descontentamento  tanto  em  relação  ao  governo  quanto  em relação às centrais sindicais próximas a ele". De outro lado, parece expressar uma tendência à acomodação política, "já que algumas organizações foram criadas em decorrência das mudanças introduzidas pelo governo na legislação sindical, de modo a se adequar a essas mudanças e se aproveitar dos benefícios por elas introduzidos. Essa acomodação política verificada na cúpula do sindicalismo brasileiro contrastada com certa vitalidade da base" (2012, p. 189).

            A abordagem de José Dari Krein et al (2012) observa as alterações nas relações de trabalho durante os governos Lula apontando sinais contraditórios em relação à flexibilização de direitos, que era a tendência predominante desde os anos 1990. Depois de fazer um balanço das medidas legislativas flexibilizadoras e outras que tendem a reforçar a perspectiva de ampliar a regulação pública do trabalho sustenta que “No balanço geral, fica evidente que a reforma trabalhista não teve grande destaque no Governo Lula" (2012, p. 25). Concluem os autores ainda que diante dos indicadores apresentados a tese da flexibilização se mostrou equivocada e dispensável para geração empregos, formalização, elevação de salários, estruturação do mercado e relações de trabalho (2012, p. 24).

            Apontadas as principais questões de cada trabalho, procuraremos explorar agora em que medida estas três abordagens podem dialogar. Como elemento comum evidentemente as três abordagens tratam do movimento sindical brasileiro. A argumentação de José Dari Krein et al (2012) de que a tese hegemônica existente nos anos 1990 de flexibilização das relações de trabalho foi perdendo força com a melhora dos indicadores do mercado de trabalho[2], especialmente após 2004, confirma a tese de Boito Jr e Marcelino (2010) que rechaçam a ideia de declínio do movimento sindical. Para estes últimos, pelo menos desde 2004 é presente uma conjuntura de recuperação da atividade sindical no Brasil. Tese que é amparada também pelo trabalho de Andreia Galvão (2012) ao indicar o surgimento de novas centrais sindicais durante o governo Lula como consequência do acirramento político no período. Portanto, os três trabalhos, por diferentes vias, partilham de um diagnóstico positivo do sindicalismo brasileiro desde a eleição de Lula em 2002.

            As conclusões de Galvão endossam ainda a conclusão de Boito Jr e Marcelino de que constitui um erro analítico analisar o sindicalismo e a classe operária separadamente no processo político.  Galvão pressupõe na sua análise que as orientações e as posições político-ideológicas assumidas pelas centrais sindicais estão relacionadas às suas bases sociais, daí porque faz a opção analítica de observar os setores econômicos em que estão inseridas e as categorias profissionais que congregam as centrais.

            Os dados mais recentes do DIEESE (2012) por outro turno confirmam as tendências apontadas pelos três trabalhos aqui discutidos. Efetivamente o movimento sindical brasileiro não foi atingido pela crise de 2008, e, na verdade ele experimentou um crescimento no campo de ação grevista em constante elevação:

Em 2012, o SAG-DIEESE registrou 873 greves. O resultado confirma a tendência de aumento do número de greves verificada a partir de 2008. As informações da série histórica também revelam que o total de greves cadastrado em 2012 é o maior verificado desde 1997. (DIEESE, 212, p. 2)

            Boito Jr. (2010) adverte que as greves não podem ser tomadas como indicador isolado do grau de vitalidade do movimento sindical, nesse sentido, os dados do DIEESE para 2012 demonstram que além da manutenção da tendência ao aumento do movimento grevista foram noticiadas ações de grevistas em 58% dos casos. As ações dos grevistas abrangeram assembleias e atos públicos (486 casos), passeatas (107 casos), piquetes (46 casos). Houve ainda a realização de acampamentos em 28 greves, de ocupações, em 25, e de vigílias, em 11. Os dados do DIEESE indicam ainda que em 75% dos casos os movimentos tiveram algum êxito nas suas reivindicações.

            Portanto, os dados afastam a ideia de que a vitalidade do movimento sindical seja proporcional ao crescimento econômico e vice-versa[3] já que é imediatamente no cenário pós-crise internacional de 2008 que o movimento sindical experimenta um largo crescimento grevista no Brasil[4].

            Caberia saber em que medida o declínio ideológico da matriz de pensamento neoliberal foi afetado pela crise de 2008 e em outro passo, até que ponto esse declínio pode ter exercido alguma influência na retomada do vigor do movimento sindical brasileiro.

            Por ora, resta da análise dos artigos aqui comentados e dos recentes dados do DIEESE, que não é possível falar do movimento sindical sem tratar de outras variáveis sociais, econômicas e, principalmente, políticas atuantes no processo. Longe de caminhar para o seu declínio parece que o movimento sindical, a despeito do processo de exclusão e criminalização ideológica perpetrada pela onda neoliberalizante de que nos fala Mustapha El Miri[5], mostra um vigor somente comparável àquele do seu florescimento na década de 80 no Brasil[6].·.

            Fica demonstrado também que o governo do PT exerceu forte influência política no movimento sindical. Resta saber, porém, em que medida, estes movimentos atuam no processo de sustentação política do governo e em que medida podem atuar para o aprofundamento das reformas ou para imposição de resistência à [possíveis] novas investidas do neoliberalismo.





[1] Balanço das Greves 2012.
[2] Possível segundo este autor devido principalmente a três medidas adotadas pelo governo Lula: Crescimento econômico manifesto no PIB em elevação a partir de 2004, políticas públicas em especial a elevação do salário mínimo e medidas de transferência de renda e as lutas e conquistas do movimento sindical foram decisivas para acrescentar melhorias ao mercado de trabalho brasileiro.
[3] Boito Jr. alerta para a complexidade da relação entre movimento sindical e crise econômica. (2010, p. 335)
[4] Por outro turno, poder-se-ia contra argumentar que o cenário de crise econômica não abalou a economia interna, que ao contrário, tem demonstrado índices de crescimento na contramão da maré recessiva internacional.

[5] A esse respeito à publicação do autor em BLEITRACH, Danielle; EL MIRI, Mustapha. Defaite ouvriere et exclusion. Ed. L'Harmattan, France. 2000.

[6] Ver a respeito: "Brasil: o movimento sindical e popular na década de dois mil” (BOITO, GALVÃO, MARCELINO) Disponível em: http://politicalatinoamericana.sociales.uba.ar/files/2011/08/galvao-boito-marcelino.pdf

quarta-feira, 6 de novembro de 2013

cometi um erro - Bukowski

me estiquei até a última prateleira do armário
e puxei de lá uma calcinha azul
e mostrei a ela e
perguntei "são suas?"

e ela olhou e disse,
"não, devem ser da cadela".

depois disso ela se foi e não a vi
desde então. não está na sua casa.
continuo passando por lá, enfiando bilhetes
debaixo da porta. volto ali e os bilhetes
continuam intocados. arranco a cruz de Malta
do retrovisor do meu carro e a amarro
com um cadarço à sua maçaneta, deixo
um livro de poemas.
ao retornar na noite seguinte tudo
continua ali.

continuo rondando as ruas em busca
daquele encouraçado cor-de-vinho que ela dirige
com uma bateria fraca, e as portas
pendendo das dobradiças estropiadas.

circulo pelas ruas
a um passo de chorar,
envergonhado de meu sentimentalismo e
possível amor.

um homem velho e confuso dirigindo na chuva
perguntando-se onde a boa sorte foi 
parar.


O amor é um cão dos diabos (2007, pag. 195).

domingo, 3 de novembro de 2013

Ano de 2012 teve 873 greves, o maior número desde 1996, diz Dieese Resultado confirma a tendência de aumento verificada a partir de 2008. 41% das greves analisadas tinham a exigência de reajuste salarial.

Foram realizadas 873 greves no país em 2012, sobre 554 no ano anterior, aponta levantamento divulgado nesta quinta-feira (23) pelo Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Socioeconômicos (Dieese). O total de greves no ano passado é o maior verificado desde 1996, diz a divulgação, quando foram 1.228 greves.
Foram 86,9 mil horas paradas em 2012, sendo que 75% do total são na esfera pública, diz o estudo
"O resultado confirma a tendência de aumento do número de greves verificada a partir de 2008", cita o estudo. Ao todo, foram 461 greves realizadas pelos trabalhadores da esfera privada e 409 na pública.
Foram contabilizadas 86,9 mil horas paradas em 2012, sendo que 75% do total são na esfera pública, diz o estudo. Nesse caso, é o maior número de horas paradas desde 1990 (quando foram 117 mil).
O aumento nas horas paradas vem sendo percebido “mais claramente” desde 2009, cita o documento.
Reivindicações
De acordo com o Dieese, 41% das greves analisadas tinham a exigência de reajuste salarial. “Em menor proporção, aparecem reivindicações de introdução, manutenção ou melhoria de auxílio-alimentação (27%); cumprimento, implantação e/ou reformulação de plano de cargos e salários (23%) e paralisações por questões relativas à participação nos lucros ou resultados (19%)”, diz o estudo, que cita, ainda, a frequência de queixas contra o atraso no pagamento dos salários (18%).
Setores
Entre as greves verificadas exclusivamente na esfera privada, a maioria atingiu o setor industrial (330). Na esfera pública, entre as empresas estatais, metade das greves foi deflagrada no setor de serviços (14). Entre o funcionalismo público, a maioria das greves foi deflagrada por servidores municipais (227).